terça-feira, 21 de abril de 2009

Uma explicação marxista sobre a crise dos alimentos (julho/2008)


Como o movimento dos trabalhadores já tinha alertado, os efeitos da crise econômica mundial já começaram a ser enfiados goela abaixo nos trabalhadores. Nos países do primeiro mundo, quem paga a conta dos empréstimos sem lastro dos bancos sãos os que estão sem emprego por causa das falências e os que estão sendo despejados. Mais cortes dos direitos trabalhistas estão acontecendo, pra aumentar a margem de lucros.

Aqui, nos países dependentes a mudança mais clara foi o aumento absurdo do preço dos alimentos. Por exemplo, no Brasil, nos últimos doze meses, houve alta de 7% no custo de vida, principalmente por causa do feijão, do pão, do arroz, da carne, da soja e do leite.

A burguesia afirma aos quatro ventos que o “culpado” disso é o plantio do etanol. Logicamente, é uma forma de dizer que os países pobres são os verdadeiros responsáveis, e livrar a cara dos EUA e da União Européia. Isso tem muito a ver com a lógica de “soma zero” em relação ao desenvolvimento sustentável. Ou seja, de que os países pobres têm que parar de crescer para deter a destruição do meio ambiente. Desde o Protocolo de Quioto, tudo o que é indústria dos países pobres é acusada de causar a fome e acabar com a natureza.

O próprio presidente do Brasil, Lula, tem desmentido esse argumento em suas viagens. Mas, ao mesmo tempo, fala que o aumento dos preços é provocado pelo crescimento dos mercados da Índia e da China. Na verdade, esse é um dado real, mas não pode explicar como aconteceu a alta repentina nos últimos meses.

Aliás, esse crescimento do consumo desses países tem base no extinção gradual do semi-feudalismo na Índia e nas reformas econômicas chinesas. Ao contrário de significar uma catástrofe, como foi o fim da URSS, as reformas chinesas acontecem dentro de um Estado Operário Deformado, o que permite direcionar o desenvolvimento das forças produtivas para aumentar o nível de consumo dos trabalhadores até um patamar muito além do que houve na Revolução Cultural ou durante o Grande Salto pra Frente. As correntes que consideram a China capitalista nos devem uma explicação sobre porque esta “restauração” tem melhorado as condições de vida das massas...

As respostas reformistas da esquerda

Mas dentro da esquerda, da direção da CUT até a “esquerda” da CONLUTAS, todos atribuem a inflação à “especulação” com as commodities. Este argumento simplista tem duas coisas como pano de fundo: a) a idéia de que na economia de hoje, a especulação não tem nenhuma base material, ou seja, de que o capitalismo virou um “cassino”; b) um conflito imaginário entre o capital produtivo e o “especulativo” que, na prática, leva estas correntes a defenderem a “indústria nacional”.

As conclusões dessa análise só podem ser a defesa do “congelamento dos preços”, como uma exigência ao governo, e de “investimento da agricultura familiar”. Ou seja, uma “defesa” dos empresários contra os especuladores (e o Governo Sarney já nos mostrou o resultado dessa política...) e uma solução que nem toca no agronegócio, se limitando a tentar “voltar a história pra trás” de volta à pequena produção rural. Os reformistas dentro e fora do governo precisam deste tipo de proposta, para fazer um “deixa disso” com os empresários e com as empresas que exploram os pequenos produtores, que são seus aliados no Projeto Democrático e Popular.

A renda da terra e a nacionalização

Na verdade, a especulação não tem como elevar os preços dos alimentos e manter uma série de outras commodities estável. O que faz com que os alimentos tenham uma tendência a se manter em patamares mais alto do que os outros produtos é a propriedade privada da terra. Como a economia burguesa considera que os preços são resultado da simples soma de uma série de fatores de produção “eternos”, a sua única saída é apelar pra explicações simplistas baseadas na oferta e na procura, como esta do etanol.

Em toda a indústria, os empresários não recebem a mais-valia diretamente produzida pelos seus trabalhadores. Por causa da concorrência entre os capitais,esta mais-valia é dividida entre todos os empresários, proporcionalmente ao valor de seus capitais aplicados. Isso é chamado de equalização da taxa de lucro, e faz com que capitais produzidos com taxas de mais-valia diferente tenham a mesma lucratividade. Se não fosse assim, cada setor da economia daria um lucro muito diferente do outro, o que paralisaria os investimentos nos setores que empregassem mais trabalhadores (produzindo mais-valia maior), o que iria paralisar o desenvolvimento tecnológico.

Na agricultura, o caso é diferente do resto da produção. Nela, geralmente a composição orgânica do capital é maior, ou seja, existem mais trabalhadores para o mesmo valor de maquinaria, o que faz com que a mais-valia produzida seja bem mais alta. O fato de haver um monopólio da propriedade da terra impede que a mais-valia produzida seja redividida com os outros capitais. Assim, este setor tem um super-lucro permanente, que se transforma em renda da terra, que é paga ao proprietário, mesmo que ele nem mesmo trabalhe lá.

Assim, a alta dos preços faz com que os empresários tenham a sua taxa de lucro normal, com o restante indo para as mãos dos donos da terra (que podem ser a mesma empresa ou pessoa). Numa situação de crise, o baixo investimento diminui as terras cultivadas (não podemos esquecer da importância dos EUA na produção agrícola mundial), o que faz com que os preços subam. Assim, a renda da terra aumenta muito. Não custa lembrar que a agricultura capitalista já está provocando uma nova fome em massa na Etiópia!

Por causa desta estrutura social, a única forma de baixar os preços é expropriar a terra. Mas isso é insuficiente se elas forem postas sob controle do Estado burguês, porque o dono da renda apenas vai mudar. Por isso, é preciso lutar pelo controle operário das terras nacionalizadas. E diante da especulação, na medida em que fosse usada como recurso para quebrar a economia, é necessário estabelecer comitês de bairro para controlar os preços, em oposição ao Estado.

É esse o programa que os reformistas e centristas não têm coragem de defender. Por isso, só um Partido Revolucionário dos Trabalhadores pode lutar por ele, e ele só pode ser cumprido por um Governo Direto dos Trabalhadores. A nossa tarefa não é tentar salvar as empresas nacionais, é esclarecer os trabalhadores sobre isso, e preparar a construção do partido.

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