QUEM SOMOS NÓS

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Somos uma organização marxista revolucionária. Procuramos intervir nas lutas de classes com um programa anticapitalista, com o objetivo de criar o Partido Revolucionário dos Trabalhadores, a seção brasileira de uma nova Internacional Revolucionária. Só com um partido revolucionário, composto em sua maioria por mulheres e negros, é possível lutar pelo governo direto dos trabalhadores, como forma de abrir caminho até o socialismo.

terça-feira, 29 de março de 2011

Movimento de cidadãos ou movimento operário?

por Paulo Araújo

            Todo mundo viu o filme V de Vingança? Na última cena, o regime fascista é derrubado na Inglaterra por uma multidão de pessoas com a máscara do herói, reunidas na frente do Parlamento. O que isso tem a ver com a discussão proposta no título do artigo? É que é dessa maneira que a maior parte da esquerda concebe uma revolução, ainda mais depois do fim da URSS, quando a burguesia fez o seu discurso de “fim do comunismo”, negando até mesmo a existência da classe operária e de algo como uma “sociedade de classes”.
            A maioria dos militantes deixou de entrar em partidos, ou seja, organizações com uma estratégia. Nós do Coletivo Lenin não temos poderes telepáticos, mas pela prática e pelo discurso da maioria dos militantes da esquerda, existe uma ideia sobre a revolução que pode ser resumida mais ou menos assim: “Hoje nós lutamos por reivindicações mínimas e imediatas. Um dia, o povo todo vai entrar nessas lutas – se formos mais ‘populares’ e evitarmos levantar muito o nível de nosso discurso – e então, quando a maioria estiver na luta, poderemos fazer uma revolução”.
            A ideologia dominante é a ideologia da classe dominante, falaram Marx e Engels. E, mesmo nesse discurso sobre a revolução, podemos ver todos os traços da ideologia burguesa. Mas qual ideologia burguesa? Ora, a da cidadania! A constituição dos EUA começa com a frase “Nós, o povo”. O movimento sem-teto carioca usa a palavra de ordem “Se morar é um direito, ocupar é um dever”. Os deputados do PSOL falam em “governar para a maioria”. Os anarquistas chamam a não votar para não “legitimar” as eleições e buscam montar grupos “horizontais”, sem líderes.
            Em todos esses casos está presente uma concepção legalista da sociedade, em que ela deveria corresponder aos direitos dos indivíduos. Assim, é igualzinho ao final do V de Vingança: a revolução é uma reunião da maioria, uma espécie de eleição nas ruas, para estabelecer a sua vontade (“Façamos das pedras nossas cédulas de votação” já diziam os jovens no maio francês de 68).
            Essa noção destrói qualquer possibilidade de entender como funciona uma revolução de verdade, quais são os setores que participam dela e como participam, qual é a sua estratégia, como ela se organiza no plano político-militar, etc. Nada disso é importante para quem defende essa concepção cidadã, porque para eles a revolução é alguma coisa fora da realidade, ou pelo menos fora do seu horizonte. Por isso, na prática, a concepção da revolução como um movimento de cidadãos é reformista. É uma concepção de revolução que pode acontecer por dentro do Estado, de maneira natural (sem um partido para organizar) e necessariamente de maneira pacífica.
            Essa visão espontaneísta da revolução se resume a dizer que as pessoas têm interesses que são negados no capitalismo. E que, se lutarem por esses interesses, vão destruir o capitalismo. Em primeiro lugar, existe a ideia de que as lutas podem se generalizar por si mesmas, sem que exista uma organização para isso. Ou seja, é a negação da necessidade um instrumento consciente para levar as lutas até a destruição do Estado, e que, pra isso, seja preciso mostrar às massas a necessidade de combater o sistema. Em outras palavras, a negação da estratégia. Sobre esse ponto, já falamos com calma no nosso artigo de 2007, O que é uma organização revolucionária e porque militar em uma?, disponível em nosso site.
            A conclusão dessa concepção é que seria necessário manter o movimento no nível das demandas mínimas, porque só assim não “afastaria o povo”. Portanto, é a negação também do programa, que é outro aspecto da negação do partido. Mas isso não é o assunto sobre o qual realmente queremos falar aqui. Existe uma ilusão ainda mais séria no seio da esquerda reformista.

Povo ou classe?

            Na verdade, toda a concepção da revolução como um movimento de cidadãos está baseada na negação da existência da classe operária como um setor distinto da sociedade. Poderíamos resumir dizendo que a ideia de revolução como movimento de cidadãos é a conclusão lógica de imaginar uma revolução sem imaginar uma sociedade dividida em classes. É o que tentaremos provar a seguir.
            A negação da estratégia é um resultado de imaginar que não existem diferenças entre todas as pessoas que são oprimidas. Assim, a maioria dos movimentos que veiculam essa ideia fala de “povo” em geral e abstratamente. Isso é uma diferença marcante com a tradição da esquerda de antes do fim da URSS. Antes, se falava em classe operária, classe trabalhadora, aliança operária e camponesa, etc. Mas a ofensiva anticomunista que acompanhou a destruição da União Soviética e a restauração do capitalismo foi tão séria que abalou o fundamento mais básico da estratégia dos ativistas do movimento operário. Que fundamento é esse? É a ideia de que existe uma classe operária!
            Hoje, a maioria das organizações de esquerda, quando fala em nome do “povo”, está conscientemente negando que haja alguma coisa no mundo real como uma classe separada das outras (e dos outros setores do povo), com traços diferentes. Isso é importante porque, dentro do marxismo, sempre se considerou que a condição estrutural da classe operária (localização na produção, concentração em um mesmo espaço físico, peso na sociedade, métodos de luta) é o que lhe dá as condições para construir o socialismo.
            É importante citar (sem nos estendermos longamente no tema) que as obras de Ricardo Antunes, sociólogo e membro da direção do PSOL (Os Sentidos do Trabalho, Adeus ao Trabalho?, etc.) são apresentadas na esquerda como um projeto para recuperar a discussão de classe, a partir de uma análise das mudanças nas relações de trabalho no capitalismo atual. Mas, na verdade, Ricardo Antunes conclui a sua pesquisa criando o conceito de “classe que vive do trabalho”, que inclui não só os assalariados na produção e circulação do capital, como os funcionários públicos e até mesmo os trabalhadores por conta própria. Ou seja, mesmo com a intenção de fazer o contrário, Ricardo Antunes também dilui a classe trabalhadora (que existe dentro das relações capitalistas de produção) dentro de toda a população que vive do próprio trabalho, com o argumento de que todos esses setores vivem em condições sociais muito parecidas. Um debate contra esse conceito de Ricardo Antunes é fundamental para uma teoria marxista do capitalismo contemporâneo. 

Pode ser real uma classe que não sabe que é classe?

            Nós já nos posicionamos sobre esse assunto no nosso artigo Quem é a classe trabalhadora?, onde combatemos tanto a concepção de diluir a classe operária no “povo” quanto a concepção stalinista/obreirista de dizer que a classe trabalhadora é formada somente por trabalhadores manuais da indústria.
            O grande argumento sobre a inexistência da classe operária é o seguinte: “As condições mudaram desde o tempo de Marx. Não existe mais a polarização da sociedade que havia no século XIX, existe agora uma 'classe média' que é grande parte da sociedade, os conflitos sociais são vividos indiferentemente pela 'antiga classe operária' e pelos outros setores (comerciantes, desempregados). Portanto, não há mais sentido em usar essas categorias ultrapassadas”. (Reparem que não estamos citando ninguém, apenas pegamos uma ideia que está “flutuando” no senso comum).
            Existe também um argumento derivado dessa concepção, que corresponde à realidade – nem mesmo os operários de macacão se vêem como “classe operária”, e sim como “povo”. Como então dizer que existe alguma diferença importante? A “classe operária” não seria, então, uma invenção da cabeça de Marx, e os comunistas tentam enquadrar a realidade à força dentro dela? Não existe sentido em retrucar simplesmente “ela não sabe que existe, mas está na estrutura da sociedade”, pois seria o mesmo que dizer que não podemos ver Papai Noel, mas ele existe. A resposta a isso só pode ser procurar a atividade real da classe operária na sociedade. “A prática é o critério da verdade”, afirmou Engels.
            Existe alguma atividade real da classe operária na sociedade? Sim! Ela se chama movimento sindical! Os outros “movimentos sociais”, mesmo que muito mais radicalizados, não se organizam diretamente a partir das linhas de demarcação da classe trabalhadora na produção e circulação, por isso são realmente movimentos do “povo pobre” e dos setores oprimidos da população, mesmo que de outras classes e estratos. Isso não quer dizer que o movimento sindical seja perfeitamente delimitado. Por influência da ideologia dominante,  o movimento sindical abarca setores não-proletários, como os funcionários do Estado (embora muitos deles cumpram funções socialmente necessárias) e até mesmo a polícia.
            Dentro do movimento sindical existe uma luta constante envolvendo as relações de produção e a circulação das mercadorias na sociedade. Entretanto, ele só organiza os setores mais estáveis e mais bem-pagos da classe trabalhadora, até porque a grande massa da classe só consegue se organizar diretamente em situações pré-revolucionárias (o que não quer dizer que os comunistas não devam tentar fazer experiências de organização desses setores mesmo em situações não-revolucionárias, e sim que essas experiências necessariamente vão ser de menor escala). Mas o próprio fato dele se enraizar nas relações de trabalho já o torna a arena fundamental de qualquer organização revolucionária (mesmo que, por questões táticas, uma organização revolucionária possa atuar prioritariamente em outro setor, durante um período curto).
            Como o movimento sindical expressa uma classe fundamental na sociedade, é ele que é capaz de gerar alternativas partidárias. Por exemplo, esse foi o caso do PT no Brasil. Muitas vezes, o movimento sindical criou partidos operários, mas nunca surgiram partidos com influência de massas dos outros “movimentos sociais”, como os sem-teto e estudantes. Mesmo os grandes partidos de base camponesa (como o Partido Comunista Chinês) foram criados por intelectuais, e não foram uma expressão política do próprio movimento sobre o qual se baseavam.

A classe operária não existe desde sempre

            Já que a classe operária existe mesmo, e se expressa através do movimento sindical, como fica a questão mais importante, a da sua consciência política de classe? Em toda sociedade de classes, existe uma luta ideológica para definir quais são os seus componentes. Por exemplo, durante o Antigo Regime, o Estado escondia sob o nome de “Terceiro Estado” tanto a burguesia quanto os trabalhadores assalariados e servos. Na atual democracia dos ricos, se fala que todo mundo é cidadão. Já no fascismo, todos eram “o povo”.
            Por isso, a conscientização de que se faz parte de uma classe, e de que ela deve lutar pelo poder para reconstruir a sociedade, só pode ser o resultado de um processo de luta de classes no plano teórico e ideológico. O exemplo da classe trabalhadora inglesa (a mais antiga do mundo) é marcante. O historiador marxista inglês E. P. Thompson, no seu livro fundamental A Formação da Classe Operária Inglesa, mostra em detalhes como essa classe chegou à consciência da sua existência e separação do restante da sociedade,  ainda que não tenha formulado uma estratégia para lutar contra o Estado burguês. Para resumir bastante, podemos dizer que, desde o século XVIII, já existia um movimento sindical, mas que era organizado segundo o modelo das corporações medievais. Somente com a influência da Revolução Francesa surgiu um movimento popular, ao redor da Sociedade Londrina de Correspondência (1792), que foi o primeiro partido operário da história, lutando pela República.
            A repressão ao movimento republicano levou a um racha entre o setor de classe média e o setor operário, que foi para a clandestinidade. Durante a clandestinidade, os trabalhadores se deram conta das divergências entre os seus interesses e os da classe média. Mas foi somente com o surgimento das primeiras teses pré-marxistas de William Thompson e Thomas Hodgskin, que afirmavam que todo o valor das mercadorias vem do trabalho, e que o capital não produz nada, e da fusão dessas teses com o movimento operário, que passou a existir claramente a ideia de que a classe operária é diferente de todos os outros setores oprimidos, e que ela pode criar outras relações de produção, instituindo o socialismo. O marco histórico disso foi o Trades Newspaper (Jornal das Categorias), editado a partir de 1825, e que unia todos os sindicatos de Londres, defendendo um programa da abolição do trabalho assalariado e substituição do capitalismo por cooperativas de trabalhadores.
            O resto, como dizem, é história. A consciência de classe evoluiu em eventos históricos como a Greve dos Tecelões de Lion, em 1832, em  que pela  primeira vez  se  falou  de  governo  operário  (o  hino  dos  operários dizia “teceremos a mortalha do velho mundo”). O inglês William Benbow, em 1833, foi o primeiro a defender a tática de greve geral, sob o nome de “Grande Feriado Nacional da Classe Operária”. Isso avançou até a experiência da Comuna de Paris em 1871, quando pela primeira vez na história colocou-se a necessidade de destruir o Estado burguês e iniciar a construção de um Estado Operário.  Desde o começo do movimento operário, entretanto, várias formas de ideologias burguesas estiveram presentes na imensa maioria da classe, o que coloca até hoje a necessidade de um partido para defender o conteúdo revolucionário (portado da teoria marxista) da classe operária e de sua luta pelo poder, formulando uma estratégia apropriada. O avanço das ideologias burguesas se mostra de maneira marcante na nossa época, fazendo-nos regredir a concepções anteriores às do Trades Newspaper, em que muitos nem mais falam em classe operária.

O que fazer?

            Com a destruição contra-revolucionária da URSS, o movimento voltou quase à estaca zero,. O nosso papel não é ficarmos com a boca cheia de dentes esperando a morte chegar e pregando o socialismo na internet e através simplesmente da venda de jornais, como fazem algumas correntes que se abstém da luta de classes na prática, como a Liga Bolchevique Internacionalista (LBI) brasileira, a Liga Espartaquista (SL) americana com seus "filhotes", a Tendência Bolchevique Internacional (TBI) [presente nos EUA, Canadá, Nova Zelândia e Europa], e o Grupo Internacionalista (IG, cuja seção no Brasil  é a  LQB). organizativamente e também no campo da teoria.
            Desde já, e dentro das condições mais difíceis da história do ponto de vista da regressão da consciência de classe, devemos tentar fundir novamente a teoria materialista da história (o marxismo), atualizada pela análise das mudanças do capitalismo contemporâneo, com o movimento real da classe trabalhadora, principalmente os sindicatos, onde uma tarefa central é combater as concepções reformistas.
            A ferramenta ideal para isso são as frações comunistas, que tenham um programa político socialista, e que participem completamente da vida dos sindicatos (e outros movimentos) e das suas lutas. O partido comunista não será construído a partir do convencimento individual, e sim através da fusão com o setor mais radical do movimento operário. Para essa fusão, a nossa primeira tarefa deve ser ganhar os melhores militantes sindicais para uma concepção política revolucionária, tarefa essa que é baseada nas concepções e experiências de partidos de vanguarda e grupos de propaganda portados da política marxista revolucionária, formuladas e aplicadas por Lênin e Trotsky.
                  Ficou provado nos anais da história que somente estes modelos de organizações conseguiram de fato levar a classe trabalhadora e outros setores explorados pelo capital ao poder, destruindo o Estado e controlando a produção através da expropriação da burguesia (ainda que em geral as burocracias stalinistas usurpassem o poder político e a gestão da economia planificada, freiando o fluxo da revolução mundial, como se viu no século XX). Dessa forma, também está provado historicamente (para quem quiser estudar e sair do romantismo pequeno-burguês) que o ápice da capacidade de coordenação e integração dessas organizações revolucionárias como instrumentos dos trabalhadores nas lutas contra a máquina mundial do capital só pode se dar em uma organização a nível internacional. 
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segunda-feira, 28 de março de 2011

Por um Programa Transitório para a questão energética!

por Paulo Araújo

A tragédia japonesa após o terremoto/tsunami e o acidente com energia nuclear, que começou no último dia 12 de março e já fez mais de 10 mil vítimas, expõe (como se ainda precisasse) a grande enganação que é a defesa da energia nuclear como "alternativa" contra o aquecimento global. Isso é defendido inclusive por ONGs ecológicas como o WWF.

Mesmo que em curto prazo a energia nuclear tenha um custo-benefício melhor que as termelétricas e hidrelétricas, ela cria um problema muito maior a longo prazo: o que fazer com os resíduos, que levam centenas de milhares de anos para perderem a radioatividade?
Por isso, nós do Coletivo Lênin defendemos o uso da energia nuclear em relação às outras formas mais poluentes, mas acreditamos que ela não é uma resposta para o problema energético. Outras formas de energia que não geram complicações (como a energia eólica, a energia solar e o hidrogênio combustível) poderiam ser expandidas desde já, reduzindo a dependência com relação ao petróleo e à energia de fissão nuclear. A única razão que impede isso é o controle energético dos países pelos grandes monopólios do petróleo e outras fontes de energia poluentes, que não podem aceitar perder espaço no mercado. No movimento de massas, defendemos que o lucro das empresas petrolíferas seja usado para financiar fontes renováveis de energia, o que ataca diretamente um dos monopólios mais importantes do capitalismo. Usar os lucros das petrolíferas e outras indústrias poluentes para expandir o uso de energia solar, eólica e hidrogênio combustível sob controle dos trabalhadores, assim como investir em pesquisas por novas alternativas! 


Também defendemos o direito dos países dependentes (como o Irã) e os estados operários deformados (China, Cuba, Coréia do Norte e Vietnã) a utilizarem a energia nuclear, inclusive a posse de armas nucleares para seus fins políticos, como impedir uma intervenção imperialista. Defendemos  que os países imperialistas tenham o seu arsenal nuclear, que é usado para impor pressão sobre os países periféricos, destruído. O arsenal nuclear da Coréia do Norte, por exemplo, é um dos poucos fatores que impedem uma ofensiva do imperialismo para retomar o território perdido pela burguesia desde o início da década de 1950.
Felizmente, o acidente nuclear de Fukushima não teve as proporções de Chernobyl, na URSS em 1986. Chernobyl foi provocado pela defasagem tecnológica e falta de manutenção do reator, que já tinha sido construído às pressas para cumprir as "metas" do plano quinquenal e, assim, garantir o "estímulo econômico" dos burocratas que geriam o país, sem nenhuma preocupação com as reais necessidades da classe operária soviética.
Nas economias planificadas burocraticamente, como era a URSS, não era o mercado que  orientava a produção, mas a casta burocrática que comandava o país. Por um lado, isso trazia a vantagem de reduzir a precarização do trabalho e a perda de condições dos trabalhadores (inclusive de segurança), já que esses Estados asseguravam um nível de vida relativamente alto como uma conquista da expropriação da burguesia. Por outro, esse controle burocrático impedia uma renovação tecnológica dos equipamentos, principalmente devido à regulação irracional da economia realizada pelas burocracias. Até mesmo no capitalismo ocorre uma renovação tecnológica (ainda que com o objetivo de maximizar os lucros). Defendemos hoje os Estados Operários ainda existentes por acreditarmos que a expulsão da burguesia do controle de Estado é uma grande conquista. Ao mesmo tempo, o controle de um grupo de burocratas sobre a produção só pode causar tragédias econômicas e catástrofes como Chernobyl.  Por isso, somente o controle operário da produção pode tornar a planificação racional e eficaz.
Uma das poucas correntes da esquerda que têm seção no Japão é o Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU). Apesar de todas as nossas críticas a este grupo (veja Pela Reconstrução da Quarta Internacional), divulgamos aqui a campanha que a seção japonesa está fazendo, como medida concreta de solidariedade de classe com os trabalhadores do Japão:
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quinta-feira, 24 de março de 2011

A polícia brugesa e a posição dos revolucionários

UPP: Terror para os Trabalhadores
Por R. Kaleb 
            Na semana após o carnaval ganharam destaque as imagens de um abuso de poder policial na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Cidade de Deus, uma das primeiras favelas a serem “pacificadas”. Supostamente para apartar uma briga que havia ocorrido numa festa de carnaval na comunidade, os policiais da UPP agiram com truculência, mandando encerrar a festa imediatamente. Segundo relatos, os policiais dispararam gás de pimenta contra os moradores.
            Diante da tentativa da polícia de encerrar a festa e devido à sua truculência, muitos que estavam participando da comemoração se revoltaram contra a hostilidade policial jogando copos e garrafas contra os policiais, o que foi a sua “justificativa” para o terror. As cenas mostram explicitamente agressões cometidas contra os moradores – vários foram espancados com cacetetes e um dos policiais disparou tiros para o alto para intimidá-los. Ao perceber que as agressões e disparos estavam sendo filmados, alguns policiais se voltaram contra o jornalista Toni Barros, que registrava o fato. Ao negar entregar sua câmera aos policiais, o jornalista foi agredido e sua câmera danificada, embora tenha salvo as imagens.
            Dois dias depois, o comandante geral da UPP, Robson Rodrigues da Silva, “reconheceu” que houve excesso  dos policiais e disse que haverá uma investigação. A tentativa do comandante de salvar a imagem das UPPs não parece ter tido o mesmo efeito das chocantes imagens dos policiais agredindo moradores indefesos. Não há nada para reconhecer aqui além do fato para o qual alertamos em nosso texto O Estado Burguês Reorganiza o Tráfico de Drogas no Rio de Janeiro:
“(...) não vai demorar para que os proletários que vivem nessas comunidades percebam a armadilha que é o domínio direto de uma polícia que mata uma pessoa a cada 8 horas nessa cidade.
            Já que estabelecem um domínio militar incontestável sobre as outras forças armadas, as UPPs diminuem momentaneamente os conflitos constantes entre facções traficantes e criam a impressão de uma situação de paz nas comunidades. Entretanto, exemplos como esse mostram que as UPPs representam uma força de repressão não menos violenta contra os trabalhadores e oprimidos, sendo inclusive muito melhor preparadas para impedir qualquer contestação de seu poder. As cenas de violência como as da ocupação do Complexo do Alemão e esta voltarão a se repetir. Aqueles que defendem as UPPs como “mal menor” terão que se explicar diante dos trabalhadores.

Corrupção da polícia e milícias
            O mais recente escândalo envolvendo a polícia do Rio de Janeiro foi o indiciamento do agora ex-comandante da polícia civil Allan Turnowski. Turnowski está sendo investigado por vazar informações sigilosas das operações da polícia para um grupo de policiais e ex-policiais que também estão sendo investigados por estarem organizando uma milícia no Complexo do Alemão, logo após a ocupação militar em novembro de 2010. Esses eventos pareceram confirmar algo que dissemos em nosso texto já citado, escrito após a ocupação do Complexo:
Muito antes de as UPPs aparecerem, já havia uma força com relações íntimas com o Estado, formada por agentes ou ex-agentes do Estado, destruindo as organizações traficantes tradicionais e estabelecendo seus regimes nas comunidades com o apoio da polícia. Isso significa que o enfraquecimento das organizações traficantes antigas tem na UPPs apenas um dos seus pontos de apoio. O outro e principal elemento é a expansão das milícias, que ocorre, não com a displicência, mas com o apoio do Estado burguês!
A divulgação maciça do fato de que já há uma milícia se organizando no Alemão parece confirmar nossas suspeitas. Já a “informação privilegiada” dos milicianos é apenas mais uma prova da colaboração da polícia com as milícias e portanto com o tráfico de drogas e armas (realizado pelas milícias) que o governo do Rio de Janeiro diz combater. Não é um fato mais chocante do que a ajuda estratégica e militar que a PM deu aos milicianos ao fornecer o uso do carro blindado (caveirão) quando estes tomaram a favela Cidade Alta, localizada em Cordovil, em 2007.
            Turnowski é o mais alto membro da hierarquia policial recentemente envolvido com o apoio às milícias no Rio de Janeiro. Durante uma declaração em sua defesa, o próprio Turnowski disse que era impossível que ele tivesse as informações que foram vazadas por que, na época, elas só eram conhecidas pelo próprio secretário de segurança do estado do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame. Essas revelações nos fazem imaginar até onde chega a colaboração direta do alto escalão do governo com as milícias.

Uma corregedoria machista
            Contra toda a noção de que a polícia “apesar dos problemas, corrige os seus excessos” é preciso lançar um olhar atento sobre o que de fato acontece diante de todas as agressões policiais contra a população. Num comentário sobre as impressões de um relator da ONU (que não é nenhuma organização humanitária) sobre a  polícia brasileira, a Agência Brasil citou:
“As principais críticas do representante da ONU foram em relação a assassinatos cometidos por policiais, ‘que na maioria das vezes não são computadas nas estatísticas sociais e raramente são investigadas pelas polícias’ (...)”
“O relator criticou duramente uma operação policial no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro – que deixou 19 mortos – e afirmou que, durante a visita à capital fluminense, não recebeu das autoridades estaduais justificativas convincentes para a invasão. ‘Concluí que foi motivada por razões políticas, para o governo mostrar que estava lutando fortemente contra o crime. Operações como essa talvez melhorem a opinião pública, mas não a vida da comunidade’, avaliou.”
“O documento produzido pela Organização da Nações Unidas (ONU) aponta a polícia como a maior responsável pelos mais de 48 mil homicídios que se cometem a cada ano no Brasil. O relator especial da ONU sobre execuções extrajudiciais, Philip Alston, afirma que as mortes deste tipo ‘estão desenfreadas’ em determinadas regiões do país. Ele esteve no Brasil de 4 a 14 de novembro de 2007, quando visitou os estados de São Paulo, Pernambuco, Rio de Janeiro e o Distrito Federal.”
‘“Policiais em serviço são responsáveis por uma proporção significativa de todas as mortes no Brasil. Enquanto a taxa de homicídios oficial de São Paulo diminuiu nos últimos anos, o número de mortos pela polícia aumentou, de fato, nos últimos 3 anos, sendo que em 2007 os policiais em serviço mataram uma pessoa por dia’, descreveu Alston no relatório. ‘No Rio de Janeiro, os policiais em serviço são responsáveis por quase 18% do número total de mortes, matando três pessoas a cada dia’, acrescentou.”
“Relator da ONU critica impunidade de assassinatos cometidos por policiais” (reportagem da Agência Brasil citada no site da Fundação Lauro Campos).
            Não existem dados sobre a apuração e punição dos crimes policiais, já que supostamente eles são investigados internamente pela corregedoria da polícia. Não é difícil imaginar que a maior parte dos crimes passam batidos. Um caso recente dá um exemplo de qual é a perspectiva dessas corregedorias. Vazaram na internet no mês de fevereiro as cenas de uma ação da corrgedoria estadual atuando na cidade de Parelheiros, em São Paulo, gravadas em 15 de junho de 2009 na 25ª DP. Ao abordar uma escrivã (que pediu para não ter o nome revelado), suspeita de receber propina, três delegados da corregedoria queriam revistá-la. A escrivã não se negou a ser revistada, apenas exigiu que fosse por uma policial mulher.
            Ignorando o direito, os três delegados cercaram, algemaram e renderam a escrivã à força no átrio da delegacia. Em seguida, arrancaram sua calça e calcinha, deixando-a forçosamente nua diante de várias testemunhas, e pegaram a propina que, de fato, a escrivã tinha escondido – 4 notas de 50, ou seja, duzentos reais. Esse ato foi cometido por aqueles que, supostamente, devem evitar os “excessos” da polícia. Se fazem isso com os próprios colegas, o que não farão contra a população trabalhadora?
            Para tornar o caso ainda mais incrível, descobriu-se, após o escândalo provacado pelo vazamento do vídeo, que a chefe da corregedoria estadual, Maria Inês Valente, havia arquivado o caso, apontando que a atitude dos delegados havia sido regular. Enquanto a escrivã sofreu um processo administrativo e foi exonerada no mesmo ano, só agora, com a divulgação do vídeo, é que os delegados envolvidos estão sendo afastados e investigados. Essa “caça à bruxas” não livrará as fuças do Estado burguês, que tenta salvar as aparências de que esse tipo de ato não é algo comum.
Alguém poderia se perguntar “Como pode a polícia aceitar seres tão boçais?”. Acontece que a razão de existência da polícia é cometer ações boçais contra a classe trabalhadora diariamente, mantê-la obediente sob o cano do fuzil. Em sua atividade cotidiana, os policiais acabam se tornando esse tipo de ser, ainda que não seja essa a sua intenção original ao integrar a polícia.

Pelo fim da polícia! Por autodefesas de trabalhadores nas comunidades!
            O abuso recente na Cidade de Deus mostra mais uma vez como a polícia é uma inimiga da população, sobretudo dos trabalhadores negros e pobres. O envolvimento tanto de Allan Turnowski com as milícias, assim como a afirmação da chefe da corregedoria, Maria Inês Valente, de que não havia nada demais na forma como agiram os policias, mostra que os abusos policiais não são “falhas” ou “excessos” cometidos pelos policiais desviados. São práticas ensinadas desde a academia e que são endossadas e repetidas pelas suas lideranças. A polícia é um instrumento dos ricos e poderosos da nossa sociedade, controlado pelos seus representantes nos governos para manterem a ordem de exploração capitalista.
            É preciso dar um conteúdo político à luta dos trabalhadores. Uma ação contra a polícia, ainda que radicalizada, terá poucos efeitos se os trabalhadores acharem que só precisam cobrar para que os governos melhorem a polícia, ou que apenas “removam os excessos”. Essa idéia de reformar a polícia tem sido a base da política dos líderes do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Marcelo Freixo (PSOL/RJ), o deputado estadual que ficou famoso ao presidir a CPI das milícias e ser representado como personagem no filme Tropa de Elite 2, acha que é progressivo o avanço da instalação de UPPs (veja o pronunciamento “Por que as UPPs não chegam a todos?” feito pelo deputado em novembro de 2010, disponível no site do seu mandato).
            A mudança que está acontecendo no controle do tráfico de drogas do Rio de Janeiro, passando das antigas organizações traficantes para as milícias (que também exploram prostituição e trabalhadores nos serviços de gás, transporte alternativo e televisão à cabo, além do tráfico de drogas) é uma das razões por trás da investida contra as comunidades e para a instalação das UPPs. Na guerra entre milícia, polícia e traficantes, os trabalhadores não tem nenhum lado preferencial – todos são nossos inimigos. A posição de Freixo se explica por sua confiança no Estado burguês. O deputado sempre comenta que o secretário de segurança Beltrame é um “bom homem” e que as suas diferenças políticas com Sérgio Cabral estão abaixo da prioridade dos dois em garantir a “segurança pública” (leia-se a continuidade do ataque policial às comunidades e o apoio por trás dos panos para as milícias) como pode ser visto nesse trecho da entrevista de Freixo à revista Época.
“Eu sou oposição política ao governador. No entanto, no debate da Segurança Pública não gosto de me posicionar como situação ou oposição. A nossa responsabilidade com a sociedade está acima dessas diferenças políticas. Por isso, eu fico muito mais confortável em falar do Beltrame que do Sérgio Cabral. O Beltrame leva uma grande vantagem porque sua honestidade o faz uma pessoa muito melhor do que os últimos secretários que existiram antes dele. Tenho uma relação muito sincera com ele. Com divergências, mas muito respeito.”
(Exame, 3 de dezembro de 2010).
            Contra os ataques da polícia, traficantes e milícias, os revolucionários devem propor e tentar organizar assembléias comunitárias independentes do governo nas favelas. Submetidas a estas assembléias devem ser criadas patrulhas de autodefesa de trabalhadores para reagirem diante das ameaças e agressões que eles sofrem, usando de todos os meios que forem necessários. Nenhuma confiança na polícia racista e machista! Por autodefesas de trabalhadores nas comunidades!
            Os trabalhadores também não devem acreditar (a custo de frustrarem sua resistência) que os policiais são trabalhadores iguais a eles e que devem ter todos os direitos de um trabalhador. Os policiais são uma força diretamente subordinada aos inimigos dos trabalhadores, a burguesia e os governos, para garantirem sua exploração no trabalho, sua opressão no locais de moradia, e sua repressão diante de qualquer tentativa de lutar contra tal situação. Não devemos ter a menor colaboração com os policiais da base da polícia e nem defender as suas demandas corporativas (aumento de salários e melhores condições de trabalho, melhores equipamentos e carros), como fazem muitos partidos na esquerda, pois isso significa melhorar as condições de repressão aos trabalhadores.
            Um exemplo disso é o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), que mesmo dirigindo uma central sindical, a CSP-CONLUTAS, defende incluir dentro dela os “sindicatos policiais” e apóiam todas as suas demandas por melhorias no aparato policial do Estado burguês. Os líderes do PSTU, quando questionados, muitas vezes se vangloriam do “benefício” disso, como ter as passeatas da CSP-CONLUTAS “escoltadas” por policiais.
            Os revolucionários devem defender apenas as demandas políticas dos policiais que coloquem em cheque o caráter burguês e assassino da polícia. Se, por exemplo, um ou mais policiais se recusassem a participar de uma operação na favela ou a seguir uma ordem de repressão, deveríamos apoiar tal posição e mesmo defender esses policiais contra as represálias dos seus superiores. Um exemplo é a manifestação realizada por policiais no dia 25 de fevereiro na Praça da Sé, contra os abusos realizados no caso da escrivã. Nessas situações, os revolucionários devem se demarcar claramente dos setores que pedem uma “polícia mais humana”, e mostrar que um fim desses abusos só é possível com o fim da própria polícia.
Esse tipo de demanda política também é o pressuposto básico de um possível racha progressivo na polícia ou no exército numa situação de crise. Mas a priori, a colaboração dos trabalhadores com a polícia só serve para frustrar a luta dos oprimidos ao uní-los com os agentes da manutenção do poder vigente, semeando adaptação à existência da polícia e impedindo a sua contestação enquanto força de repressão. “Sindicatos policiais” não são parte do movimento dos trabalhadores! Pela sua expulsão das centrais e federações sindicais!
            Enquanto estão “protegidos” pela polícia, os dirigentes do PSTU descartam qualquer pretensão revolucionária com relação ao exército e à polícia. Essa é uma reação completamente contrária à polícia daquela da vanguarda dos trabalhadores, principalmente os operários negros mais reprimidos. O apetite de um revolucionário não deve ser “ganhar” os aparatos armados da burguesia capitulando aos próprios interesses dos policiais, mas sim rachar os elementos de baixa patente mais conscientes para um programa operário, que busque destruir a essência dos órgãos de repressão junto com o resto do Estado burguês.
            Mas não é esse, é claro, o objetivo do PSTU, que pretende reformar a polícia, mantê-la intacta em seus interesses burgueses. Num trecho particularmente interessante de sua declaração sobre os eventos que abalaram o Rio de Janeiro em novembro do ano passado, o PSTU escreveu:
“A nova polícia teria que se organizar de forma radicalmente diferente da atual. Deve desaparecer a diferença entre polícia civil e militar, que não serve de nada, e assegurar todas as liberdades sindicais e políticas a seus participantes. É preciso também que seus comandantes ou delegados sejam eleitos pela população da região onde atuam. Ao contrário dos que se escandalizem com a proposta, a eleição de delegados locais é realizada em muitos países, inclusive nos EUA. É uma forma democrática de comprometer esses comandantes com a população local.” (site do PSTU).
Assim, apesar de um discurso aparente mais radical, substitui-se a perspectiva de destruição da polícia, rachando os seus elementos mais avançados, por uma adaptação à existência da polícia sob formas “democráticas”, como a polícia americana, que por si só já mostra como é “democrática” a repressão a negros e imigrantes.
            A ferramenta política necessária para armar a resistência contra a polícia é um Partido Revolucionário de trabalhadores, que esteja junto aos operários, sobretudo os operários negros, que são os mais atingidos pela violência policial e também pela exploração das milícias e organizações traficantes. Esse partido terá a tarefa de levar os trabalhadores à conclusão que a saída tanto para acabar com a super-exploração e opressão dos trabalhadores negros, quanto com a violência que atinge os trabalhadores em geral, é instituir um governo controlado por eles próprios, através de assembléias e representantes eleitos e substituíveis a qualquer momento (diferente dos políticos do Estado burguês). Uma tarefa essencial nesse processo é acabar com a polícia, que demonstradamente colabora com o crime organizado e é uma ferramenta de violência contra os trabalhadores para impedí-los de se levantarem contra seus exploradores. Chega de chacina, polícia assassina! Por um Partido Revolucionário de trabalhadores sem ilusões com os carrascos do povo!
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quarta-feira, 23 de março de 2011

Balanço do ato no Rio de Janeiro contra o imperialismo

Balanço do ato no Rio de Janeiro contra o imperialismo
Para a felicidade de Obama e Dilma, governistas e Conlutas Desarticularam o Movimento!


            Desde a chamada para as manifestações contra a presença de Obama no Brasil, realizada na reunião do dia 16 de março no SINDIPETRO-RJ, na qual estavam presentes as mais diversas organizações de esquerda, das mais combativas às mais centristas e reformistas, ficou claro que uma manifestação anti-imperialista contra Obama na Cinelândia não era o foco das organizações governistas, nem do PSOL (incluindo as suas correntes pseudo-trotskistas) ou do PSTU. Em uma clara tentativa de sabotar o ato, fazendo dele apenas algo para se dizer que “ao menos tentamos”, as correntes majoritárias do PT (antes de Dilma mandar o partido se retirar da organização e não tomar parte no ato), além do PCdoB e PSOL, fecharam acordo para que a concentração no domingo ocorresse na Glória, bem longe da Cinelândia, onde Obama estaria. Mas pior ainda foi o PSTU, que dividiu o movimento puxando um ato em separado na sexta (18), e convocando a concentração de domingo (20) para o Largo do Machado, a 8 quilômetros da Cinelândia!

            Frente à indisposição desses setores, nós do Coletivo Lenin nos juntamos à Liga Comunista, à FIST e à RECC, e formamos uma frente combativa em torno do compromisso de no domingo marchar em direção à Cinelândia ou até onde fosse possível, mesmo que as capitulação e indisposição das direções de correntes governistas e não-governistas predominassem, traindo a luta. Assim, estivemos dispostos a intervir no domingo numa frente única contra a presença de Obama no Brasil, sem capitular às políticas majoritárias de divisionismo, do oportunismo e do social-pacifismo da “esquerda” eleitoral e sindical tradicional.


Sexta-feira: social-pacifismo e voluntarismo

            Na sexta-feira, estivemos presentes no pequeno ato da Candelária (cerca de 200 manifestantes) chamado pelo PSTU em conjunto com outras organizações de esquerda, enquanto a CUT e a CTB boicotavam e se “preparavam” para domingo. Ao chegar ao consulado Norte-Americano, a manifestação foi duramente reprimida pela polícia, que havia recebido apoio e orientação dos aparatos de repressão imperialistas para organizar a “segurança” da cidade. Muitas das prisões e revistas foram efetuadas por oficiais majores, capitães e tenentes da PM, mostrando claramente a posição de serviçais do imperialismo do alto-comando da PM do Rio.
          Infelizmente, o voluntarismo de algum membro do ato (que de forma irresponsável jogou um coquetel molotov em direção ao consulado) forneceu a desculpa necessária para a reação da PM, resultando em 13 prisões arbitrárias, além de desmobilizar a base e dar argumentos para as organizações de esquerda serem difamadas pela Rede Globo e demais órgãos da imprensa burguesa. Mas tão ruim quanto o voluntarismo de quem jogou o explosivo, sem se preocupar se isso seria uma ação isolada (ao invés da expressão de uma real disposição do ato para o enfrentamento), foi o social-pacifismo do PSTU, que passou os dias seguintes fazendo declarações públicas sobre a necessidade dos atos serem pacíficos e contra a violência em manifestações, como a declaração do assessor do partido Rodrigo Noel, que informou à imprensa: “Por tradição, fazemos manifestação e não concordamos com qualquer tipo de violência. Não queremos desmoralizar nossos atos”.

Esse tipo de linha só serve para desarmar e deseducar os militantes dos movimentos sociais, deixando-os totalmente despreparados para atos radicalizados ou em que ocorra forte repressão e enfrentamento. Obviamente, não apoiamos ações isoladas e irresponsáveis como a do companheiro que jogou o molotov (chamado pelo PSTU de “infiltrado”), pois esse tipo de ação tenta substituir a necessidade de mobilização e preparo das massas pela força de vontade individual. Mas isso não significa contribuir para a concepção pacifista que marcou a repercussão da prisão dos 13 manifestantes, que chegaram a ser levados para presídios e casa de detenção (no caso do menor de idade). Exigimos a retirada de todas as acusações contra os presos políticos (que apenas na segunda, após a partida de Obama, receberam habeas corpus). Não à criminalização dos movimentos sociais! Abaixo a repressão policial! Contra o voluntarismo irresponsável e o social-pacifismo!


Domingo: direções traidoras impedem manifestação de avançar até Cinelândia

            Apesar da forte repressão e do aparato policial, dos presos políticos de sexta-feira, e ainda o fato de CUT/PT terem desistido de participar do ato por pressão do governo Dilma, foi mantida a manifestação de domingo. Como já falamos, inicialmente a concentração foi propositalmente rachada, com concentrações em lugares distintos e distantes, mostrando a indisposição dessas diversas direções em construir um “Fora Obama” forte e combativo. Mesmo assim, estavam presentes de 500 a 600 pessoas, muito mais gente que na sexta. Parte disso foi graças à sensibilização de muitos militantes do PSTU e PSOL após as prisões arbitrárias de sexta. Mas infelizmente, essa insatisfação não foi suficiente para romper com o social-pacifismo de suas direções. Vimos claramente que poderíamos ter dado a volta pela praça do Passeio Público para chegar à Cinelândia, mas a  manifestação foi orientada para uma perigosa armadilha ao seguir pela Rua do Passeio (do outro lado da bifurcação criada pela praça), onde a direção do ato parou a marcha no meio da rua, mesmo ela estando inicialmente livre.

O argumento foi que haveria um “banho de sangue” se a marcha seguisse da rua até a Cinelândia. Uma desculpa que não nos convenceu. Estava claro que o comando do ato, composto pelo PSTU, PSOL, PCdoB e MST, propositalmente orientou a marcha para esse beco sem saída (pois logo em seguida a rua foi fechada pela polícia) com o intuito de prontamente dispersar os militantes de suas organizações, usando essa falsa argumentação do “banho de sangue”. Quem certamente ficou feliz com essa traição foram Sérgio Cabral e Dilma, que devem ter aplaudido a forma como as direções dos movimento sociais “aprenderam a lição” na sexta e não se atreveram a ir muito longe no domingo.

            Porém, nem todos abaixaram a cabeça e voltaram para casa. Nesse momento, a Frente Única contra a presença de Obama no Brasil, criada pelo CL, LC, FIST e RECC antes do ato, já na perspectiva de que haveria uma traição desse tipo, polarizou a marcha com a voz e a vontade política de seus militantes, questionado publicamente as direções traidoras e chamando todos os militantes presentes para continuar a marchar até a Cinelândia antes que a Cavalaria da PM nos cercasse de vez nas duas entradas da rua.  Para dialogar com os militantes do PSTU e PSOL, aos quais pertenciam boa parte dos presos de sexta, puxamos a palavra de ordem “Para os presos libertar, precisamos avançar”, mostrando para a base desses partidos as contradições políticas das suas direções que acataram a mensagem de Cabral e da PM.

Em resposta, fomos hostilizados por alguns dirigentes partidários, mas nada que nos fizesse parar. Em pouco tempo, graças a essa capitulação da direção do ato, a cavalaria da PM fechou a rua. Dessa forma, para evitar que sua base rachasse diante da crise, a direção do PSTU chamou os seus militantes de volta para a sua sede alegando que “tudo o que podia ser feito já tinha sido feito”. Enquanto isso a maior parte das outras organizações optaram por seguir a orientação de dispersar a manifestação imposta pela CSP-Conlutas, CTB, PSOL e MST.


Apesar dos pelegos, para o CL, LC, FIST e RECC a luta continua!

            Apesar das direções traidoras terem dispersado a manifestação, concretizando todas as avaliações e previsões, graças à real vontade de algums grupos em levar a cabo uma manifestação anti-Obama e anti-imperialista, conseguimos chegar na Cinelândia.

            Nós do Coletivo Lenin, junto com a Liga Comunista, a Frente Internacionalista dos Sem-teto, e a Rede de Estudantes Classistas e Combativos, mostramos nossa disposição e coerência política com aquilo que propomos como Frente Única: “Vamos caminhar hoje até onde pudermos contra Obama e o Imperialismo!” (Confira abaixo o manifesto da Frente Única Contra a Presença de Obama no Brasil). Também na Cinelândia encontramos outras organizações políticas como o Morena-CB e o PCR, dispostas assim como nós a passar pela barreira política das direções pelegas e a protestar diante da barreira policial montada em volta do Theatro Municipal.

            Conseguimos assim defender os presos políticos diante da mídia burguesa e popular (enquanto o PSTU e PSOL deixaram essa tarefa para seus advogados e para a lei burguesa); denunciamos e combatemos a repressão policial do Estado; e ainda denunciamos e exigimos a expulsão das tropas imperialistas dos Estados Unidos, ONU e OTAN da Líbia, Iraque, Afeganistão e Haiti, com palavras de ordem como: “Fora já, fora já daqui, Obama da Líbia e Dilma do Haiti!” e “Estão no mesmo saco, Obama e caveirão. Libertem nossos presos e abaixo a repressão!”

            Assim, esse dia ficou marcado por uma profunda experiência política. Ficou claro que as direções conciliadoras são os maiores freios para a luta de classes, por sempre se adaptarem à democracia burguesa e capitularem ao social-pacifismo, se esquivando da luta por fora dos meios legais do Estado. A denúncia das prisões dos ativistas foi muitas vezes usada como válvula para espalhar o social-pacifismo e desarticular o movimento nos momentos mais críticos. Por todos os fatos, mostramos que a nossa política estava correta, e fomos consequentes com ela, desmascarando essas direções traidoras no movimento e evidenciando o valor de uma militância política combativa que não se atém aos valores democratistas dominantes hoje no movimento de massas. Nesse dia, mostramos para boa parte da esquerda e para o líder imperialista presente no Brasil que sim, nós podemos lutar!

Abaixo está transcrito o panfleto distribuído pela Frente Única Contra a Presença de Obama no Brasil.

Vamos caminhar hoje até onde pudermos 
contra Obama e o Imperialismo!

Todos estamos aqui hoje porque dizemos nos opor à presença de Obama no Brasil. Entretanto, alguns parecem ter se esforçado para garantir que os protestos contra o chefe-mor do imperialismo seriam esvaziados. A CUT, Força Sindical, CTB e outras centrais que apóiam Dilma, não colocaram esforço para construir este ato. Achamos que isso tem um motivo político e não que é simples “desorganização”. Já que é Dilma, a chefe do Estado burguês brasileiro, a anfitriã de Obama, os lideres sindicais que apóiam este governo vão fazer de tudo para não “envergonhá-lo” diante do imperialismo. Acreditamos que por nos opormos aos acordos econômicos de Dilma com o imperialismo, não podemos participar dessa sabotagem de dentro do nosso próprio movimento.

De forma parecida, alguns setores da oposição de esquerda tem se limitado ao “calendário oficial” proposto pelos burocratas sindicais para frustrar a luta dos trabalhadores. Além de convocar inicialmente um ato ainda mais distante de onde estará Obama (no Largo do Machado, a 8 quilômetros da Cinelândia!) do que este marcado pelas grandes centrais, a CSP-Conlutas, dirigida pelo PSTU e pelo PSOL, não está tomando nenhuma iniciativa para se opor ao rumo que os burocratas querem dar – um ato “só para não dizer que não fizemos nada” e sem nenhuma ousadia.

Achamos que isso não é o suficiente para demonstrar nossa insatisfação contra o imperialismo, não apenas no Brasil, mas também no Haiti, no Iraque, Afeganistão e no que está sendo feito na Líbia. Se os burocratas que hoje lideram a CUT e outras centrais governistas não querem se chocar contra o governo, apesar dos claros ataques contra trabalhadores e oprimidos, os verdadeiros inimigos do imperialismo deveriam organizar uma medida que coloque outra pauta na mesa. É a isso que nos propomos, já que outros setores de oposição, como PSTU e PSOL não querem lançar uma ação independente dos capachos de Dilma que lideram as centrais.

Existe risco de que hoje essas lideranças nem queiram sair da Glória (concentração do ato marcado pelas grandes centrais, que fica também distante, a quase 2 quilômetros de onde estará Obama), e demais locais de concentração, ou talvez dêem apenas alguns passos, usando como justificativa a repressão policial para nem ameaçar caminhar pela cidade, afastando os manifestantes do chefe imperialista. Achamos que o ato de hoje deve chamar o máximo de atenção inclusive para defender os companheiros de algumas dessas organizações citadas, que foram presos no ato contra Obama na última sexta-feira, e estão até agora presos nas celas do Estado burguês.

Hoje chamamos todos a caminhar até onde pudermos! Nós, membros de uma frente composta por trabalhadores e estudantes classistas, organizações revolucionárias trotskistas, organizações de sem-teto, de favelas e de torcedores independentes, nos opomos aos governistas sindicais e seus satélites, que não querem fazer um ato combativo. Queremos que todos os ativistas honestos caminhem conosco num sinal de oposição firme ao imperialismo, ao capitalismo, ao terrorismo e genocídio de Estado e em repúdio a esta sabotagem. Vamos tentar, ainda que sejamos poucos, a ir até onde for possível.

Fora Obama do Afeganistão, Iraque, Haiti, Líbia e Brasil!
Pela liberdade imediata de todos os presos políticos que lutam contra os assassinos de Estado, inclusive aqueles 13 na justa manifestação da última sexta-feira contra Obama!

Frente Única Contra a Presença de Obama no Brasil
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quinta-feira, 17 de março de 2011

Fora Obama do Brasil! Abaixo o governo pró-imperialista do PT!

Por L. Torres

No próximo domingo (20 de março) a Cinelândia, local que já foi palco de históricas manifestações dos movimentos sociais cariocas, estará abrigando o representante-mor do imperialismo norte-americano, Obama, que discursará para o povo brasileiro.

Manfestações já tem sido planejadas para dizer em alto e bom som que o comandante-em-chefe das tropas que hoje oprimem trabalhadores nos mais variados locais do mundo, com Haiti, Iraque, Afeganistão, e já ameaçam invadir tambem a Líbia, não é nem um pouco bem-vindo.

O PT de Lula e Dilma, entretanto, fez questão de deixar claro que está do lado do Tio Sam: a direção do partido e os pelegos da direção nacional da CUT declararam para a mídia que não apoiam as manifestações. Mais ainda, cedendo aos apelos de Ségio "Caveirão" Cabral e Eduardo "UPP" Paes, exterminadores de negros pobres, o PT tem pressionado seus militantes para não participarem dos atos e reuniões anti-Obama. Achamos necessário que os militantes honestos e combativos da base do PT e da CUT digam "não" aos seus dirigentes e "sim" à demonstração de força contra o imperialismo, integrando em peso as manifestações.

Isso mostra a contradição do governo do PT em aliança com os empresários: se por um lado tenta agradar os movimentos sociais e cooptaçá-los para seu projeto de tímidas reformas sociais, por outro está à mando dos empresários, banqueiros e latifundiários do Brasil, além é claro, do imperialismo dos EUA. A presença de tropas de repressão brasileiras no Haiti deixa isso tão claro que até cego consegue ver.

Convocamos todos os militantes combativos do Rio de Janeiro a irem às ruas nesse domingo dizerem que Obama não é bem vindo no Brasil! A concentração será a partir das 10h da manhã, ao lado da estação de metrô da Glória.

  • Contra a entrega do pré-sal ao imperialismo e suas empresas! Pelo monopólio estatal do petróleo e pela estatização sob controle operário da Petrobrás!
  • Fora as tropas de ocupação brasileira e norte americana no Haiti! Fora as tropas imperialistas do Iraque, Afeganistão, Colômbia e Palestina! Abaixo o embargo à Cuba!
  • Viva as revoltas populares no Oriente e Norte da África! Nem Kadafi, nem Obama, por uma Assembléia Constituinte controlada por conselhos operários!
  • Abaixo o governo do PT em aliança com os empresários, por um governo direto dos trabalhadores!
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O Grupo Internacionalista e o compromisso dos burocratas com seu "legado"


Grupo Internacionalista / Liga Quarta Internacionalista do Brasil:
Ainda cambaleando em torno de uma “explicação séria”

O seguinte artigo foi originalmente publicado pelo Reagrupamento Revolucionário (RR) em agosto de 2009. Sua tradução para o português foi realizada pelo Coletivo Lenin em fevereiro de 2011, a partir da versão presente no site do RR.



           Enquanto critica corretamente muitas das posições atuais da Liga Espartaquista (SL) [organização dos EUA], a liderança do Grupo Internacionalista [IG – organização internacional que dirige a Liga Quarta Internacionalista do Brasil, LQB] persiste rigidamente na defesa da suposta integridade política de tal organização até o momento em que eles forma expulsos dela em 1996. Os líderes do IG escolheram construir a sua organização em torno desse mito e, mais especificamente, continuam insistindo que a SL estava “singularmente correta” ao longo dos anos ‘80 em seu entendimento distorcido das posições trotskistas sobre o stalinismo e a defesa da União Soviética. Tendo eles próprios sido antigos líderes centrais da SL, que participaram ativamente no desenvolvimento de sua linha política, a defesa do histórico da mesma sempre foi uma questão de proteção dos seus próprios legados pessoais e prestígio burocrático. Como consequência da teimosa insistência do Partido Comunista Alemão em defender a sua política, que permitiu que Hitler ascendesse ao poder sem resistência (“Primeiro Hitler, depois nós”), Leon Trotsky foi forçado a concluir que qualquer organização que colocasse o prestígio da sua liderança na frente de falar a verdade, merecia ser descartada de qualquer propósito revolucionário.
            Em política, é inevitável, quando se segue adiante com a lógica de uma posição errada em uma questão, que em última instância isso tenha consequências imprevistas em uma ou várias outras questões que poderiam parecer, num primeiro momento, não ter relação com a política original. Após o recente terremoto no Haiti, a SL colheu o que plantou quando ela, escandalosamente e de forma inesperada, acabou apoiando a ocupação do Haiti pelo exército dos Estados Unidos, acreditando nas palavras de Obama de que ele estava lá para prover ajuda às sofridas massas haitianas [ver A Liga Espartaquista apoia as tropas americanas no Haiti, de fevereiro de 2010].

Haiti, Afeganistão e Líbano
            Em uma carta recente para a SL, condenando sua demorada e incompleta autocrítica, numa questão na qual, em relação ao restante da esquerda, ela foi “singularmente” incorreta sobre o Haiti (veja “Liga Espartaquista: Nossa Linha Mudou Novamente”), a liderança do IG repreende a SL por sua tentativa de, por um lado se distanciar da sua vergonhosa posição original, enquanto por outro cambaleia na hora de repudiá-la abertamente, ao mesmo tempo em que se recusa a examinar de forma completa a “raiz da traição” em seu mais recente reconhecimento de uma ação errada.

“Vocês admitem o crime, mas falham em dar uma explicação séria das razões para ele. E isso garante virtualmente que ele acontecerá de novo [...].”

“Apesar de suas declarações arrependidas de hoje, como podemos saber que aquilo que vocês dirão amanhã não será uma continuação do que vocês disseram ontem?”
Carta Aberta do Grupo Internacionalista para a Liga Espartaquista e a ICL [organização internacional da SL], 8 de maio de 2010.
Reimpresso em The Internationalist nº21, verão de 2010

            A carta do IG para a SL defende a posição de que o Haiti foi “uma extensão de uma capitulação prévia às pressões do imperialismo americano”, apontando o repúdio aberto da SL em chamar pela derrota do imperialismo dos EUA no Afeganistão em 2002, que a SL ainda defende, como seu precedente mais significativo.

“Nessa época vocês atacaram perversamente o Grupo Internacionalista/Liga pela Quarta Internacional por nosso chamado desde o começo (em nossa declaração de 14 de setembro de 2001) pela defesa do Afeganistão e pela derrota do imperialismo americano. Vocês escreveram que nossa linha nos levava a sermos 'Os representantes do discurso anti-americano' como vocês declararam num subtítulo, e que apelávamos para uma plateia de nacionalistas 'terceiro-mundistas' para os quais 'americano bom é americano morto' [...].”

            Mas a posição da SL no Afeganistão, por sua vez, teve um precedente com a posição que ela teve no Líbano em 1983, quando se recusou a defender militarmente o mesmo lado que as forças lutando pelo fim da ocupação militar dos EUA em seu país. Já que eles ainda estavam na liderança da SL naquela época, os fundadores do IG ainda defendem aquela posição hoje em dia. De maneira similar, num livreto da SL de 1990 (também produzido quando os fundadores do IG ainda eram líderes dessa organização) intitulado Trotskismo: O Que É e O Que Não É Isso!, a SL declarou que a Tendência Bolchevique Internacional (IBT), que na época teve a posição correta (mas que desde então se degenerou burocraticamente)

“deseja assassinatos indiscriminados em massa de americanos [...].”

            (Para um comentário sobre a posterior degeneração burocrática da IBT, veja “A Estrada para Fora de Rileyville”)

            Já que a posição da SL no Líbano ainda é defendida pela liderança do IG hoje, pode-se razoavelmente perguntar a eles como, apesar de suas “declarações arrependidas de hoje”, nós podemos saber que “aquilo que vocês dirão amanhã” não será uma repetição “do que vocês disseram ontem”?

“Bússola política”: a “explicação séria” das “raízes da traição”
            Em nosso próprio texto sobre a SL e o Haiti, nós observamos:

“o IG inferiu que a SL realizou um giro diante de uma histeria chauvinista. Enquanto a SL certamente realizou tais giros no passado, como sua assustada reação ao 11 de Setembro e à guerra do Afeganistão em 2001, nenhuma atmosfera similar existe em relação ao Haiti nesse momento”.
“Desintegração no 'Período Pós-soviético': A Liga Espartaquista Apóia as Tropas Americanas no Haiti”, 15 de fevereiro de 2010

            Enquanto as duas posições foram ambas traições programáticas e de fato tem muitos paralelos uma com a outra, ao contrário do Afeganistão, a linha da SL no Haiti não é tanto um reflexo de nenhuma pressão imediata externa, e sim suas antigas contradições políticas/metodológicas e organizativas.
            Ao mostrar algumas dessas contradições, nossa declaração de 15 de fevereiro de 2010 sobre a linha pró-imperialista da SL se referiu a uma polêmica prévia com o IG sobre sua defesa do legado da SL nos anos 1980 na “questão russa”.

“Como elaborado de maneira mais completa numa polêmica anterior (IG: Programa de Transição de Trotsky ou Bússola Política de Robertson, de 6 de maio de 2009), a SL baseou praticamente toda a sua existência durante os anos de 1980 na questão da defesa da URSS. No velório da sua queda, eles construíram uma visão de mundo sob a qual, assim como previamente todas as questões eram vistas sob o prisma da defesa da União Soviética, hoje todas as questões são vistas através do estreito prisma da sua morte. Não é mais apenas a crise subjetiva de liderança que atrasa as lutas da classe operária, mas uma nova circunstância objetiva onde a questão de tomar o poder de Estado se coloca fora da agenda histórica por uma razão ou por outra.”

“Aqueles que desistem da classe operária são forçados a procurar por salvação em outras forças sociais. Durante os anos 1980, numa desorientação simétrica à de hoje, as visões e medos extremamente exagerados da SL sobre os 'perigos dos anos Reagan' combinados com o desmantelamento de suas frações sindicais, os levou a enxergar os stalinistas soviéticos e seu exército e poderio econômico como os protetores dos ataques do imperialismo. Hoje, a URSS não existe mais e Cuba não pode agir como um substituto suficiente na região.”

            Nessa polêmica com o IG, nós citamos uma intervenção em um curso aberto de tal organização que resumiu um importante aspecto da metodologia da SL sobre a questão:

“Eu concordo com muitas das atuais críticas do IG ao fato de a SL ter explicitamente abandonado o programa de transição. Eu também concordo que essa posição está relacionada à extrema desmoralização da SL após o colapso da URSS. Isso se expressou na sua recente posição na luta contra a lei de flexibilização de contratos de emprego na França, quando eles proclamaram que no ‘mundo pós-soviético’ não é provável que uma greve geral seja bem sucedida. Alguns anos atrás, quando o Afeganistão foi atacado, membros da SL argumentaram de maneira similar que no mundo pós-soviético vitórias militares de neocolônias contra os imperialistas não estava na agenda. Enquanto o colapso da URSS foi uma grande derrota, por si próprio ele não é uma explicação de nada disso. Deve-se olhar também para a história da própria SL anterior a esse colapso e seus vários zigue-zagues na questão russa, posições pelas quais a liderança do IG também é responsável por ter desenvolvido e ainda reivindicá-las hoje em dia, das quais eu só vou comentar um aspecto.”

“Ao longo dos anos 1980, a SL desenvolveu uma forte tendência a reduzir o trotskismo à questão do defensismo soviético. Esse giro foi parcialmente reconhecido na época em que eu era um membro da SYC [juventude da Liga Espartaquista], quando membros da ICL eram criticados por abandonar em parte a visão de que eles eram o partido da revolução mundial. Desde que passou a ver a defesa da URSS como a questão central em todos os lugares e ocasiões, da Nicarágua até a Austrália, surgiu uma tendência para ver o mundo a partir do estreito ponto de vista da pergunta 'Está bom assim para a Rússia?'.”

“Frequentemente se escrevia e se afirmava internamente que a defesa da URSS era a 'bússola política' da SL, que iria prevenir sua degeneração, um tipo de talismã mágico para espantar espíritos do anti-trotskismo. Em contraste, o Programa de Transição declara que a Quarta Internacional deve 'basear seu programa na lógica da luta de classes', o que é bem diferente de usar a defesa da URSS como uma bússola política. Mas o que acontece quando se continua usando tal bússola depois que ela não existe mais? (Nós descobrimos faz 2 anos que trocar acusações internamente sobre desejos de abandonar a defesa da URSS ainda é uma norma para eles). O desenvolvimento seguinte em um agrupamento propagandista passivo que o IG descreveu e a recente posição da SL na França novamente confirma isso. Mas os líderes do IG são incapazes de fazer tal análise. Eles estão determinados a defender aquelas posições, já que eles próprios são inteiramente responsáveis por ajudar a desenvolvê-las enquanto líderes da SL”.

            Nós também mostramos que tal compreensão também desempenhou um papel em distorcer a atitude trotskista diante do imperialismo durante os anos 1980.

“Em outra parte do Oriente Médio, a SL tentou encobrir o seu abandono do apoio militar para aqueles que lutavam contra a ocupação dos fuzileiros dos Estados Unidos em seu país, cinicamente perguntando 'Onde está o lado justo e anti-imperialista no Líbano hoje?' e então explicando as condições nas quais eles iriam tomar parte:

“'Se os EUA entrarem em guerra contra a Síria, uma reavaliação completa seria necessária, não menos porque tal guerra poderia se tornar um conflito real entre os EUA e a URSS, no qual os marxistas defenderiam o lado soviético'”
“'Marxismo e Banho de Sangue'
  'Workers Vanguard nº345, 6 de janeiro de 1984'”

            Enquanto o IG tem tentado explicar que todas as suas diferenças com a SL surgidas após o seu racha são originárias da desmoralização da SL após a queda da URSS, o grupo se recusa a reconhecer que essa desmoralização extrema deriva diretamente da metodologia que eles próprios são responsáveis por ter desenvolvido até o momento da sua própria expulsão.
            Nós fomos de certa forma pegos um pouco de surpresa pelo que pareceu ser um reconhecimento implícito da exatidão da nossa crítica na carta do IG.

“Tudo se origina no devastador impacto sobre a Liga Espartaquista e a Liga Comunista Internacional (ICL) da destruição contra-revolucionária da União Soviética e dos Estados operários deformados europeus em 1989-92.”

“Observem o que aconteceu após o ataque de 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center e ao Pentágono, que claramente abalou a SL e a ICL. Mas tendo perdido a sua bússola política com o fim da União Soviética, a SL/ICL reagiu abandonando elementos chave do programa leninista-trotskista com relação à guerra imperialista” (ênfase nossa).

            Fazendo uma busca no Google, descobrimos que é a primeira vez em que uma discussão sobre a antiga “bússola política” da SL é levantada nas publicações do IG. O uso da SL da defesa da URSS como sua “bússola política”, como frequentemente declarado por ela na época, era a característica essencial da SL quando os fundadores do IG ainda eram líderes nessa organização, sendo assim uma parte central dos seus legados políticos, a qual eles seriam responsáveis por ter que honestamente reconhecer como erros. Até onde a afirmação do IG é de que a desmoralização após a queda da URSS foi a explicação chave para sua saída da SL e a justificativa para sua existência independente, tal reconhecimento também ofereceria a única explicação para a natureza altamente profunda dessa desmoralização agora, mesmo duas décadas depois do fato, quando quase todos na esquerda (com a exceção do geriátrico PC pró-Moscou) ou se recuperaram ou pelo menos estão em processo de recuperação. Parece que um reconhecimento muito mais explícito, sincero e rigoroso deveria ser cobrado, em lugar de um reconhecimento improvisado feito de maneira passageira na carta do IG. Como isso difere da maneira da SL de cambalear em repudiar abertamente a sua posição no Haiti?
            Nós desafiamos os membros de base do IG a testar a “franqueza” dos seus líderes, ou talvez mais apropriadamente, o seu próprio poder dentro da sua organização, ao tentarem fazer força para exigir um reconhecimento explícito dos seus erros.

Carma: tudo que vai, volta
            Nós não temos nenhuma confiança na habilidade ou força de vontade da liderança do IG em fazer um balanço honesto do papel que eles desempenharam na degeneração da SL. Não apenas na questão da degeneração da linha política, mas também no papel a que eles se prestaram na burocratização da SL quando eles próprios estavam na liderança, ajudando ou liderando as perseguições aos críticos para expulsá-los e depois caluniá-los.
            Enquanto reclamam de terem sido vítimas de um “ataque preventivo” de caráter organizativo engendrado, na época de sua expulsão, por Alison Spencer (cujo crédito dentro do grupo diminuiu desde então, mas que na época estava namorando com a ideia de substituir Jim Robertson como a “líder” da SL), dois anos depois do fato, o líder principal do IG, Jan Norden, ainda estava se vangloriando por tê-la ajudado num expurgo igualmente maquiavélico, típico de um Zinoviev, na seção italiana da Liga Comunista Internacional (dominada pela SL/EUA).

“Você descreve, a partir do documento sobre a Itália, que parecia que Norden havia feito um bloco com Parks (Spencer) em cima das diferenças sobre chamar, de qualquer maneira que fosse, por uma greve geral na Itália. Na Itália, eu de fato fiz um bloco com Parks contra Gino, cuja política encobria a frente popular. Naquela situação, chamar os burocratas (que eram os únicos na posição de fazer isso) a organizar uma greve geral ilimitada, significava chamar por mais militância sindical com o objetivo de estabelecer as bases para uma coalizão de centro-esquerda para substituir o governo de direita de Berlusconi e Fini. Um 'bloco' contra esse embrião de tendência, representado por Gino, que se opunha ao programa trotskista [ou seja, um 'ataque preventivo' organizativo – ênfase nossa] era não apenas principista mas obrigatório. Era extremamente necessário formar uma maioria para lutar contra a provocação frente-populista.”
“Carta do IG ao MEG”, 18 de julho de 1998
Reimpresso em “Polêmicas com o IG”
Boletim Trotskista nº6

            Não é levado em conta o fato de que, após terem sido eles próprios expulsos da SL, o IG desenvolveu críticas fundamentalmente similares às de Gino com relação ao abandono que SL/ICL fez dos chamados por greve geral, ou que eles próprios acabaram sendo vítimas dos mesmos métodos organizativos usados contra Gino. O que está envolvido é, mais uma vez, a questão dos seus legados pessoais e prestígio burocrático.
            Em contraste, grande parte dos membros de base do IG, sendo subjetivamente revolucionários, ainda podem desempenhar um importante papel em ajudar a reconstruir a Quarta Internacional. Mas eles só podem fazer isso se prestarem ampla lealdade à luta pela revolução socialista, acima da estreita lealdade à organização na qual eles estão atualmente engessados. Assim como a recente tragédia dos membros de base da SL (que unanimemente apoiaram a linha pró-imperialista no Haiti e depois passaram a unanimemente repudiá-la quando o “líder” da SL mudou de ideia) mostra que aqueles que são incapazes de se erguer contra os burocratas do seu próprio partido jamais poderão se erguer diante da classe dominante.

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