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Somos uma organização marxista revolucionária. Procuramos intervir nas lutas de classes com um programa anticapitalista, com o objetivo de criar o Partido Revolucionário dos Trabalhadores, a seção brasileira de uma nova Internacional Revolucionária. Só com um partido revolucionário, composto em sua maioria por mulheres e negros, é possível lutar pelo governo direto dos trabalhadores, como forma de abrir caminho até o socialismo.

quinta-feira, 17 de março de 2011

O Grupo Internacionalista e o compromisso dos burocratas com seu "legado"


Grupo Internacionalista / Liga Quarta Internacionalista do Brasil:
Ainda cambaleando em torno de uma “explicação séria”

O seguinte artigo foi originalmente publicado pelo Reagrupamento Revolucionário (RR) em agosto de 2009. Sua tradução para o português foi realizada pelo Coletivo Lenin em fevereiro de 2011, a partir da versão presente no site do RR.



           Enquanto critica corretamente muitas das posições atuais da Liga Espartaquista (SL) [organização dos EUA], a liderança do Grupo Internacionalista [IG – organização internacional que dirige a Liga Quarta Internacionalista do Brasil, LQB] persiste rigidamente na defesa da suposta integridade política de tal organização até o momento em que eles forma expulsos dela em 1996. Os líderes do IG escolheram construir a sua organização em torno desse mito e, mais especificamente, continuam insistindo que a SL estava “singularmente correta” ao longo dos anos ‘80 em seu entendimento distorcido das posições trotskistas sobre o stalinismo e a defesa da União Soviética. Tendo eles próprios sido antigos líderes centrais da SL, que participaram ativamente no desenvolvimento de sua linha política, a defesa do histórico da mesma sempre foi uma questão de proteção dos seus próprios legados pessoais e prestígio burocrático. Como consequência da teimosa insistência do Partido Comunista Alemão em defender a sua política, que permitiu que Hitler ascendesse ao poder sem resistência (“Primeiro Hitler, depois nós”), Leon Trotsky foi forçado a concluir que qualquer organização que colocasse o prestígio da sua liderança na frente de falar a verdade, merecia ser descartada de qualquer propósito revolucionário.
            Em política, é inevitável, quando se segue adiante com a lógica de uma posição errada em uma questão, que em última instância isso tenha consequências imprevistas em uma ou várias outras questões que poderiam parecer, num primeiro momento, não ter relação com a política original. Após o recente terremoto no Haiti, a SL colheu o que plantou quando ela, escandalosamente e de forma inesperada, acabou apoiando a ocupação do Haiti pelo exército dos Estados Unidos, acreditando nas palavras de Obama de que ele estava lá para prover ajuda às sofridas massas haitianas [ver A Liga Espartaquista apoia as tropas americanas no Haiti, de fevereiro de 2010].

Haiti, Afeganistão e Líbano
            Em uma carta recente para a SL, condenando sua demorada e incompleta autocrítica, numa questão na qual, em relação ao restante da esquerda, ela foi “singularmente” incorreta sobre o Haiti (veja “Liga Espartaquista: Nossa Linha Mudou Novamente”), a liderança do IG repreende a SL por sua tentativa de, por um lado se distanciar da sua vergonhosa posição original, enquanto por outro cambaleia na hora de repudiá-la abertamente, ao mesmo tempo em que se recusa a examinar de forma completa a “raiz da traição” em seu mais recente reconhecimento de uma ação errada.

“Vocês admitem o crime, mas falham em dar uma explicação séria das razões para ele. E isso garante virtualmente que ele acontecerá de novo [...].”

“Apesar de suas declarações arrependidas de hoje, como podemos saber que aquilo que vocês dirão amanhã não será uma continuação do que vocês disseram ontem?”
Carta Aberta do Grupo Internacionalista para a Liga Espartaquista e a ICL [organização internacional da SL], 8 de maio de 2010.
Reimpresso em The Internationalist nº21, verão de 2010

            A carta do IG para a SL defende a posição de que o Haiti foi “uma extensão de uma capitulação prévia às pressões do imperialismo americano”, apontando o repúdio aberto da SL em chamar pela derrota do imperialismo dos EUA no Afeganistão em 2002, que a SL ainda defende, como seu precedente mais significativo.

“Nessa época vocês atacaram perversamente o Grupo Internacionalista/Liga pela Quarta Internacional por nosso chamado desde o começo (em nossa declaração de 14 de setembro de 2001) pela defesa do Afeganistão e pela derrota do imperialismo americano. Vocês escreveram que nossa linha nos levava a sermos 'Os representantes do discurso anti-americano' como vocês declararam num subtítulo, e que apelávamos para uma plateia de nacionalistas 'terceiro-mundistas' para os quais 'americano bom é americano morto' [...].”

            Mas a posição da SL no Afeganistão, por sua vez, teve um precedente com a posição que ela teve no Líbano em 1983, quando se recusou a defender militarmente o mesmo lado que as forças lutando pelo fim da ocupação militar dos EUA em seu país. Já que eles ainda estavam na liderança da SL naquela época, os fundadores do IG ainda defendem aquela posição hoje em dia. De maneira similar, num livreto da SL de 1990 (também produzido quando os fundadores do IG ainda eram líderes dessa organização) intitulado Trotskismo: O Que É e O Que Não É Isso!, a SL declarou que a Tendência Bolchevique Internacional (IBT), que na época teve a posição correta (mas que desde então se degenerou burocraticamente)

“deseja assassinatos indiscriminados em massa de americanos [...].”

            (Para um comentário sobre a posterior degeneração burocrática da IBT, veja “A Estrada para Fora de Rileyville”)

            Já que a posição da SL no Líbano ainda é defendida pela liderança do IG hoje, pode-se razoavelmente perguntar a eles como, apesar de suas “declarações arrependidas de hoje”, nós podemos saber que “aquilo que vocês dirão amanhã” não será uma repetição “do que vocês disseram ontem”?

“Bússola política”: a “explicação séria” das “raízes da traição”
            Em nosso próprio texto sobre a SL e o Haiti, nós observamos:

“o IG inferiu que a SL realizou um giro diante de uma histeria chauvinista. Enquanto a SL certamente realizou tais giros no passado, como sua assustada reação ao 11 de Setembro e à guerra do Afeganistão em 2001, nenhuma atmosfera similar existe em relação ao Haiti nesse momento”.
“Desintegração no 'Período Pós-soviético': A Liga Espartaquista Apóia as Tropas Americanas no Haiti”, 15 de fevereiro de 2010

            Enquanto as duas posições foram ambas traições programáticas e de fato tem muitos paralelos uma com a outra, ao contrário do Afeganistão, a linha da SL no Haiti não é tanto um reflexo de nenhuma pressão imediata externa, e sim suas antigas contradições políticas/metodológicas e organizativas.
            Ao mostrar algumas dessas contradições, nossa declaração de 15 de fevereiro de 2010 sobre a linha pró-imperialista da SL se referiu a uma polêmica prévia com o IG sobre sua defesa do legado da SL nos anos 1980 na “questão russa”.

“Como elaborado de maneira mais completa numa polêmica anterior (IG: Programa de Transição de Trotsky ou Bússola Política de Robertson, de 6 de maio de 2009), a SL baseou praticamente toda a sua existência durante os anos de 1980 na questão da defesa da URSS. No velório da sua queda, eles construíram uma visão de mundo sob a qual, assim como previamente todas as questões eram vistas sob o prisma da defesa da União Soviética, hoje todas as questões são vistas através do estreito prisma da sua morte. Não é mais apenas a crise subjetiva de liderança que atrasa as lutas da classe operária, mas uma nova circunstância objetiva onde a questão de tomar o poder de Estado se coloca fora da agenda histórica por uma razão ou por outra.”

“Aqueles que desistem da classe operária são forçados a procurar por salvação em outras forças sociais. Durante os anos 1980, numa desorientação simétrica à de hoje, as visões e medos extremamente exagerados da SL sobre os 'perigos dos anos Reagan' combinados com o desmantelamento de suas frações sindicais, os levou a enxergar os stalinistas soviéticos e seu exército e poderio econômico como os protetores dos ataques do imperialismo. Hoje, a URSS não existe mais e Cuba não pode agir como um substituto suficiente na região.”

            Nessa polêmica com o IG, nós citamos uma intervenção em um curso aberto de tal organização que resumiu um importante aspecto da metodologia da SL sobre a questão:

“Eu concordo com muitas das atuais críticas do IG ao fato de a SL ter explicitamente abandonado o programa de transição. Eu também concordo que essa posição está relacionada à extrema desmoralização da SL após o colapso da URSS. Isso se expressou na sua recente posição na luta contra a lei de flexibilização de contratos de emprego na França, quando eles proclamaram que no ‘mundo pós-soviético’ não é provável que uma greve geral seja bem sucedida. Alguns anos atrás, quando o Afeganistão foi atacado, membros da SL argumentaram de maneira similar que no mundo pós-soviético vitórias militares de neocolônias contra os imperialistas não estava na agenda. Enquanto o colapso da URSS foi uma grande derrota, por si próprio ele não é uma explicação de nada disso. Deve-se olhar também para a história da própria SL anterior a esse colapso e seus vários zigue-zagues na questão russa, posições pelas quais a liderança do IG também é responsável por ter desenvolvido e ainda reivindicá-las hoje em dia, das quais eu só vou comentar um aspecto.”

“Ao longo dos anos 1980, a SL desenvolveu uma forte tendência a reduzir o trotskismo à questão do defensismo soviético. Esse giro foi parcialmente reconhecido na época em que eu era um membro da SYC [juventude da Liga Espartaquista], quando membros da ICL eram criticados por abandonar em parte a visão de que eles eram o partido da revolução mundial. Desde que passou a ver a defesa da URSS como a questão central em todos os lugares e ocasiões, da Nicarágua até a Austrália, surgiu uma tendência para ver o mundo a partir do estreito ponto de vista da pergunta 'Está bom assim para a Rússia?'.”

“Frequentemente se escrevia e se afirmava internamente que a defesa da URSS era a 'bússola política' da SL, que iria prevenir sua degeneração, um tipo de talismã mágico para espantar espíritos do anti-trotskismo. Em contraste, o Programa de Transição declara que a Quarta Internacional deve 'basear seu programa na lógica da luta de classes', o que é bem diferente de usar a defesa da URSS como uma bússola política. Mas o que acontece quando se continua usando tal bússola depois que ela não existe mais? (Nós descobrimos faz 2 anos que trocar acusações internamente sobre desejos de abandonar a defesa da URSS ainda é uma norma para eles). O desenvolvimento seguinte em um agrupamento propagandista passivo que o IG descreveu e a recente posição da SL na França novamente confirma isso. Mas os líderes do IG são incapazes de fazer tal análise. Eles estão determinados a defender aquelas posições, já que eles próprios são inteiramente responsáveis por ajudar a desenvolvê-las enquanto líderes da SL”.

            Nós também mostramos que tal compreensão também desempenhou um papel em distorcer a atitude trotskista diante do imperialismo durante os anos 1980.

“Em outra parte do Oriente Médio, a SL tentou encobrir o seu abandono do apoio militar para aqueles que lutavam contra a ocupação dos fuzileiros dos Estados Unidos em seu país, cinicamente perguntando 'Onde está o lado justo e anti-imperialista no Líbano hoje?' e então explicando as condições nas quais eles iriam tomar parte:

“'Se os EUA entrarem em guerra contra a Síria, uma reavaliação completa seria necessária, não menos porque tal guerra poderia se tornar um conflito real entre os EUA e a URSS, no qual os marxistas defenderiam o lado soviético'”
“'Marxismo e Banho de Sangue'
  'Workers Vanguard nº345, 6 de janeiro de 1984'”

            Enquanto o IG tem tentado explicar que todas as suas diferenças com a SL surgidas após o seu racha são originárias da desmoralização da SL após a queda da URSS, o grupo se recusa a reconhecer que essa desmoralização extrema deriva diretamente da metodologia que eles próprios são responsáveis por ter desenvolvido até o momento da sua própria expulsão.
            Nós fomos de certa forma pegos um pouco de surpresa pelo que pareceu ser um reconhecimento implícito da exatidão da nossa crítica na carta do IG.

“Tudo se origina no devastador impacto sobre a Liga Espartaquista e a Liga Comunista Internacional (ICL) da destruição contra-revolucionária da União Soviética e dos Estados operários deformados europeus em 1989-92.”

“Observem o que aconteceu após o ataque de 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center e ao Pentágono, que claramente abalou a SL e a ICL. Mas tendo perdido a sua bússola política com o fim da União Soviética, a SL/ICL reagiu abandonando elementos chave do programa leninista-trotskista com relação à guerra imperialista” (ênfase nossa).

            Fazendo uma busca no Google, descobrimos que é a primeira vez em que uma discussão sobre a antiga “bússola política” da SL é levantada nas publicações do IG. O uso da SL da defesa da URSS como sua “bússola política”, como frequentemente declarado por ela na época, era a característica essencial da SL quando os fundadores do IG ainda eram líderes nessa organização, sendo assim uma parte central dos seus legados políticos, a qual eles seriam responsáveis por ter que honestamente reconhecer como erros. Até onde a afirmação do IG é de que a desmoralização após a queda da URSS foi a explicação chave para sua saída da SL e a justificativa para sua existência independente, tal reconhecimento também ofereceria a única explicação para a natureza altamente profunda dessa desmoralização agora, mesmo duas décadas depois do fato, quando quase todos na esquerda (com a exceção do geriátrico PC pró-Moscou) ou se recuperaram ou pelo menos estão em processo de recuperação. Parece que um reconhecimento muito mais explícito, sincero e rigoroso deveria ser cobrado, em lugar de um reconhecimento improvisado feito de maneira passageira na carta do IG. Como isso difere da maneira da SL de cambalear em repudiar abertamente a sua posição no Haiti?
            Nós desafiamos os membros de base do IG a testar a “franqueza” dos seus líderes, ou talvez mais apropriadamente, o seu próprio poder dentro da sua organização, ao tentarem fazer força para exigir um reconhecimento explícito dos seus erros.

Carma: tudo que vai, volta
            Nós não temos nenhuma confiança na habilidade ou força de vontade da liderança do IG em fazer um balanço honesto do papel que eles desempenharam na degeneração da SL. Não apenas na questão da degeneração da linha política, mas também no papel a que eles se prestaram na burocratização da SL quando eles próprios estavam na liderança, ajudando ou liderando as perseguições aos críticos para expulsá-los e depois caluniá-los.
            Enquanto reclamam de terem sido vítimas de um “ataque preventivo” de caráter organizativo engendrado, na época de sua expulsão, por Alison Spencer (cujo crédito dentro do grupo diminuiu desde então, mas que na época estava namorando com a ideia de substituir Jim Robertson como a “líder” da SL), dois anos depois do fato, o líder principal do IG, Jan Norden, ainda estava se vangloriando por tê-la ajudado num expurgo igualmente maquiavélico, típico de um Zinoviev, na seção italiana da Liga Comunista Internacional (dominada pela SL/EUA).

“Você descreve, a partir do documento sobre a Itália, que parecia que Norden havia feito um bloco com Parks (Spencer) em cima das diferenças sobre chamar, de qualquer maneira que fosse, por uma greve geral na Itália. Na Itália, eu de fato fiz um bloco com Parks contra Gino, cuja política encobria a frente popular. Naquela situação, chamar os burocratas (que eram os únicos na posição de fazer isso) a organizar uma greve geral ilimitada, significava chamar por mais militância sindical com o objetivo de estabelecer as bases para uma coalizão de centro-esquerda para substituir o governo de direita de Berlusconi e Fini. Um 'bloco' contra esse embrião de tendência, representado por Gino, que se opunha ao programa trotskista [ou seja, um 'ataque preventivo' organizativo – ênfase nossa] era não apenas principista mas obrigatório. Era extremamente necessário formar uma maioria para lutar contra a provocação frente-populista.”
“Carta do IG ao MEG”, 18 de julho de 1998
Reimpresso em “Polêmicas com o IG”
Boletim Trotskista nº6

            Não é levado em conta o fato de que, após terem sido eles próprios expulsos da SL, o IG desenvolveu críticas fundamentalmente similares às de Gino com relação ao abandono que SL/ICL fez dos chamados por greve geral, ou que eles próprios acabaram sendo vítimas dos mesmos métodos organizativos usados contra Gino. O que está envolvido é, mais uma vez, a questão dos seus legados pessoais e prestígio burocrático.
            Em contraste, grande parte dos membros de base do IG, sendo subjetivamente revolucionários, ainda podem desempenhar um importante papel em ajudar a reconstruir a Quarta Internacional. Mas eles só podem fazer isso se prestarem ampla lealdade à luta pela revolução socialista, acima da estreita lealdade à organização na qual eles estão atualmente engessados. Assim como a recente tragédia dos membros de base da SL (que unanimemente apoiaram a linha pró-imperialista no Haiti e depois passaram a unanimemente repudiá-la quando o “líder” da SL mudou de ideia) mostra que aqueles que são incapazes de se erguer contra os burocratas do seu próprio partido jamais poderão se erguer diante da classe dominante.

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