Alguns integrantes do Coletivo Lenin não se sentiram
contemplados pela posição adotada pela organização sobre o segundo turno das
eleições. Por isso, se fez necessário escrever este documento que apresente uma
alternativa coerente ao voto crítico no PT nas atuais eleições.
É importante dizer que este documento representa a
posição de uma parte minoritária da organização, que respeita a posição da
maioria e a reconhece como tal; mas faz uso do direito democrático de expor
suas divergências para que debates importantes como esses não se restrinjam ao
espaço interno da organização.
Começar pelo começo.
Antes de mais nada, é importante dizer que não temos
qualquer preconceito em relação à participação em eleições burguesas e também
em relação a qualquer posição que possa ser tomada nestes períodos, desde que
esteja submetida a alguns requisitos classistas básicos, como independência
política e financeira, defesa dos interesses da classe trabalhadora e propaganda
da necessidade de romper com o capitalismo.
Nas eleições atuais, não é uma exceção. Mas hoje,
talvez especialmente nos dias de hoje, é preciso manter os pés no chão.
Precisamos ser realistas quanto à consciência da classe trabalhadora da qual
fazemos parte e para a qual nos dirigimos diariamente, mas precisamos também
saber, que é nas horas mais tenebrosas, que se torna mais imprescindível nos
mantermos fiéis aos mínimos princípios que achamos fundamentais.
Dois perigos principais precisam ser combatidos na
hora de tomar decisões. Um deles é o dogmatismo, que disfarçado de ortodoxia,
traz fórmulas prontas para os problemas da realidade e não permite uma análise
dialética da realidade para tentar chegar na resposta que melhor represente o
interesse da classe trabalhadora. O outro é o impressionismo, que eleva
aspectos pouco relevantes ao nível de “últimas gotas d’água”, simplesmente para
justificar o vai e vem de posições miraculosas que irão salvar a classe
trabalhadora do último inimigo inventado da ordem do dia.
Tentaremos não cair em nenhum dos dois extremos;
resgatando a posição clássica, baseada na independência de classe e na
confiança na única força capaz de fazer frente ao capital: a classe
trabalhadora organizada. Enquanto ao mesmo tempo tentamos dialogar com as
questões colocadas pela classe trabalhadora, que apesar de muitas vezes se
restringirem a pragmatismo, são também um dos aspectos mais importantes na hora
de tomar de posições.
O princípio classista nas eleições
As eleições não são nada mais além de mais uma das
maneiras da classe dominante manter o seu controle sobre a classe trabalhadora.
Não é preciso ser marxista para saber que é tudo um jogo de cartas marcadas. De
alguns em alguns anos, empresas, a grande mídia, bancos criam um circo. Uma
alegoria de democracia. Eles fazem suas apostas em figuras públicas que julgam
mais carismáticas para ocuparem os cargos no Estado que só serve a eles
próprios. Ganha o candidato que receber mais dinheiro de campanha e souber
usá-lo melhor como promovendo escândalos midiáticos contra os outros
candidatos, comprando horário eleitoral extra, pagando pessoas para ficar
panfletando e comparecer em falsos comícios. A única democracia que existe nas
eleições é entre as diferentes facções da burguesia, que se divertem, como
viciados apostando em cavalos de corrida. A classe trabalhadora,
maioria esmagadora da população de qualquer país escolhe apenas com qual molho
vai ser cozida por mais alguns anos.
Por isso, defendemos que a denúncia do
sistema eleitoral deve ser o carro chefe de qualquer campanha séria de uma
organização que se pretenda ser parte da vanguarda da classe trabalhadora.
Alimentar qualquer tipo de ilusão no voto ou em candidato x ou y é um erro
básico de propaganda revolucionária. Perder isso de vista pelo oba-oba do circo
das eleições significa muitas vezes uma derrota maior que receber zero votos
nas urnas.
Sobre o financiamento de campanha, é óbvio que se
qualquer partido se mantivesse realmente fiel, tanto no discurso como na
prática, a esse princípio básico de não deixar de lado a denúncia do sistema
eleitoral comandado por grandes empresas e bancos e a necessidade de acabar com
o capital, nenhuma grande empresa ou banco iria financiar tal campanha. Logo o
financiamento público acaba sendo uma consequência da propaganda revolucionária
feita corretamente nas eleições.
É necessário defender uma nova maneira de fazer
democracia, coletiva e classista. Não precisamos de senhores engravatados para
falarem em nosso nome. Todos nós da classe trabalhadora, a juventude, os trabalhadores
desempregados, as donas de casa, e todos os grupos sociais oprimidos pelo
Estado, somos mais do que capazes de resolver coletivamente nossos problemas,
de comandar nossas empresas e bancos, nossas escolas e nossas ruas, de proteger
nossos companheiros e companheiras. O Estado que tenta nos enganar dizendo que
governa em nosso nome e para nós, só faz mentir. Sua existência, com polícias
assassinas, altos impostos, descaso com saúde e educação, desemprego, falta de
casa, e toda a mentira de que a sua própria existência é necessária, não nos
serve para nada. Defendemos uma nova sociedade, onde todo indivíduo possa
comandar a política de todos os locais que lhe dizem respeito. Defendemos uma
democracia muito diferente daquela que temos nas nossas câmaras e congresso,
nos nossos palácios governamentais.
Esquecer disso, é fazer uma concessão ao Estado, que não estamos em
condições de fazer. Esquecer de denunciar o Estado e todos os seus crimes, só
porque estamos em época de eleição é um erro que não tem volta.
Algumas organizações de esquerda, fiéis ao princípio
de não financiamento burguês de suas campanhas (mesmo que nem sempre), acabam
muitas vezes por esquecer da necessidade de se ter uma campanha eleitoral
centrada na denúncia do sistema eleitoral. Isso como já foi dito, é entrar no
jogo dos banqueiros e empresários, um jogo que não é nosso, um jogo que só
temos a perder. Disputar votos com candidatos milionários com campanhas
milionárias é dar murro em ponta de faca, pois é uma luta contra o capital, num
terreno que não temos a menor vantagem. A única arena que temos chances de vencer é
aquela que podemos contar com a força da classe trabalhadora, a força de ser a
maioria e de entender como nenhuma outra classe o funcionamento da sociedade,
já que somos nós que a fazemos funcionar.
Nada temos contra a tática dos militantes de
organizações e partidos de esquerda, que minimamente entendem o papel do
Estado, e se candidataram para fazer propaganda revolucionária no horário
eleitoral gratuito dos meios de comunicação burgueses, e para aproveitar a
comoção que a burguesia consegue impor à classe trabalhadora em épocas de
eleição para promover uma posição classista. Mas fazer uso dessas oportunidades,
deixando a denúncia do capitalismo e da sua “festa da democracia” para segundo
plano; fazer isso para disputar votos com banqueiros e empresários,
propagandeando um capitalismo mais humano, ou um Estado para todos, é perder
energias à toa, um luxo que não podemos nos dar.
A necessidade do diálogo com as
condições atuais
O voto nulo talvez seja a posição mais
revolucionária perante as eleições. Ou simplesmente o ato de não votar por si
só. Este último talvez seja um pouco mais complicado, já que o voto é
obrigatório e não votar pode gerar algumas complicações legais. Sendo obrigado
a votar, a posição mais revolucionária de um indivíduo da classe trabalhadora
talvez seja o voto nulo. A maneira mais prática de dizer não diante de um
sistema eleitoral que só serve para legitimar um Estado que nada tem a oferecer
à classe trabalhadora. Seria correto dizer, que numa eleição burguesa que
ocorresse num país numa situação pré-revolucionária (possibilidade real da
classe trabalhadora organizada destruir o Estado), a abstenção nas eleições
seria a maioria.
A desilusão com o voto é um indício de que a
classe trabalhadora está num estágio de consciência que compreende que a única
posição perante o Estado que se apresenta para nós é lutar contra ele para
destruí-lo. No entanto, assim como qualquer avanço de consciência, isso também
é um processo. Não se pode exigir que a classe trabalhadora simplesmente tenha
uma compreensão súbita do papel do Estado na sociedade, simplesmente pare de
votar e faça a revolução; caso fosse assim, estaria tudo muito bem.
É preciso saber dialogar com as necessidades
imediatas da classe trabalhadora como um todo, dando respostas para essas
necessidades, que apontem para um caminho, que por sua vez, deixe cada vez mais
claro a necessidade de lutar por uma nova sociedade. As organizações que defendem o
voto nulo por princípio simplesmente não levam isso em consideração e exigem da
classe trabalhadora a aceitação de uma posição revolucionária, sem levar em
consideração a condição em que vivem os trabalhadores e trabalhadoras e o
momento história em que vivemos.
Infelizmente essas necessidades, não são “Onde vamos
atacar primeiro para tomar o poder?” ou “Qual setor devemos socializar
primeiro, o agrícola ou o energético?”. Não estamos numa situação
revolucionária. A pouca vanguarda organizada que existe no Brasil não consegue
ser uma alternativa de gestão do Brasil. Essa é a mais dura verdade.
A maioria dos trabalhadores e trabalhadoras sente na
pele diariamente a falta de hospitais e escolas, o cansaço, a violência, a
falta de dinheiro e todos os outros tantos males que a burguesia nos deu de
presente. E são bombardeados diariamente por propaganda com resposta para todos
esses problemas, pela TV, pela religião, pela família. “Seja um trabalhador
exemplar, trabalhe duro e subirá na vida!” É contra essa propaganda que devemos
atuar, apresentando uma alternativa real e coerente a toda essa baboseira,
dialogando, propondo e aprendendo, sem chegar com uma posição pronta e exigir a
aceitação porque ela é “correta”. Na hora das eleições não é diferente.
Vote consciente. Conheça seus candidatos. Cobre
deles. Você é responsável pelos eleitos. Vote em mim, eu sou a mudança. Vote em
mim, vou continuar melhorando sua vida. Não vote em fulano, ele é corrupto. Não
vote em cicrano, ele é comunista... blá blá blá. São essas as piadas asquerosas
repetidas todo santo dia de época de eleição. Mas, como já disse, a esquerda
não consegue apresentar uma alternativa coerente a essa propaganda. Nós não
temos força para dizer “Chega. Calem a boca. Faremos do nosso jeito agora!” e
ser escutados em todo o Brasil. O que fazer nesse cenário? O que fazer para
aumentar nossas fileiras e começarmos a poder ser ouvidos, não na TV, nem só
nas eleições, mas nas fábricas, escolas, ruas e em todo canto? O que dizer para
os poucos que ainda nos escutam e para os que procuram por uma resposta além
das mentiras diárias?
Antes de tentar formular essa resposta, gostaríamos
de explicar porque a tática pronta de voto crítico no PT ou do voto nulo não
nos contempla, e para não deixar passar em branco vamos falar um pouco do PSDB
também.
PSDB: fantasma de um passado distante,
mas nunca esquecido.
É até difícil escolher por onde começar a falar do
PSDB. Decidimos colocar esse trecho no documento, porque acreditamos que uma
parcela considerável da classe trabalhadora acredita que o PSDB é uma
alternativa melhor do que o PT. Apesar de acharmos que o PT não é muito
diferente do PSDB, essa avaliação é a mais distante da realidade possível.
No cenário que já descrevemos, onde a classe
trabalhadora não possui uma referência real na esquerda organizada, é natural
que ela se volte (principalmente no segundo turno, onde é um ou outro) para os
candidatos, onde cada um promete mil e uma maravilhas. Um desses candidatos é
Aécio.
Essa parte do documento se destinará unicamente às
pessoas que vêem no candidato tucano uma saída para o caos sempre presente na
nossa vida, sem saber direito o que representa o PSDB.
O PSDB e o PT possuem projetos diferentes de gestão do
Estado. O primeiro segue a cartilha do que chamamos de neoliberalismo. Em
poucas palavras, podemos dizer que o neoliberalismo se caracteriza pela mínima
intervenção do Estado na economia, ou seja, deixar o bicho correr solto no
mercado financeiro e na maneira que as empresas tratam seus trabalhadores, não
ter nenhuma medida que assegure mínimos direitos necessários para a classe
trabalhadora, como aqueles garantidos pela CLT. Como o Estado não pode intervir
na economia, o Brasil fica ainda mais aberto às grandes multinacionais e aos
desejos dos patrões. Logo se trata também de uma privatização em massa de todo
e qualquer serviço social, como saúde, educação, e como vem sendo dito, provavelmente
até as prisões.
Se ainda não dá pra ver o problema nisso, imagine
que você é um membro de um grupo que não possui força política na atual
sociedade. Há outro grupo que, para ganhar mais dinheiro, precisa que você
ganhe menos e tenha cada vez menos acesso a lazer, cultura, saúde, educação,
etc.; só que esse grupo possui toda a força política e o aval do Estado para
fazer o que quiser. Pois é, é exatamente isso que acontece no capitalismo, e é
elevado ao extremo no neoliberalismo.
Essa política de privatizar serviços
públicos, não intervir na economia para criar mais empregos, e fazer valer
direitos trabalhistas, favorecer os mais ricos e ferrar os mais pobres sem
qualquer freio; deu tão errado no Brasil, mas tão errado, que boa parte da
classe trabalhadora ainda hoje não vota mais no PSDB porque sentiu na pele a
piora da qualidade de vida na época do FHC, viu o lixo que é o seu projeto para
o Brasil, e sem precisar nem de propaganda da esquerda para entender isso,
passou a odiar profundamente essa corja.
E ainda tem mais, em aliança com Aécio,
estão os setores mais reacionários da política brasileira. Desde seguidores de
Olavo de Carvalho e Rodrigo Constantino (cavaleiros alados na luta contra o
demônio comunista que é o PT), até apoiadores explícitos da ditadura militar
que torturou e assassinou milhares, como Bolsonaro; e também aqueles que usam
religião para pregar o ódio aos grupos com diferentes orientações sexuais,
religiões de origem africana, como Marco Feliciano, Silas Malafaia, Everaldo,
etc. Essas alianças, repercutidas no congresso nacional abrem portas para a
criação de leis que podem piorar cada vez mais a condição de vida dos
trabalhadores e trabalhadoras, como a redução da maioridade penal, que já vem
sido discutida amplamente por essa frente reacionária.
Se você se incomoda com a postura do PT, quando o
aumento do salário mínimo é inferior ao da inflação; quando escuta mais um novo
escândalo de corrupção, quando escuta o absurdo dos altos impostos, quando vê
que não tem saúde, educação, saneamento básico e moradia para toda classe
trabalhadora. Nós também nos indignamos, mas é preciso dizer que o PSDB não é a
solução. As coisas irão piorar com Aécio a frente do Estado, simplesmente pelos
princípios que ele, junto com o os aliados que são o que há de pior na
política, defendem. Salários não precisarão ter pisos, porque tudo ser
negociado entre patrão e empregado, inclusive cortes salariais. É possível que
os impostos não aumentem mais (porque abaixar certamente não irão), mas teremos
cada vez mais escolas e universidades privadas, hospitais públicos
privatizados, SUS mais abandonado ainda do que já estão e por aí vai, fim dos
mínimos programas de assistência social, aumento do desemprego, aumento da
inflação, fim da Caixa Econômica e Banco do Brasil (bancos minimamente
públicos, cuja uma das funções é financiar programas sociais) como já anunciou
Armínio Fraga, seu ministro da fazenda. Pra resumir, definitivamente não
estaremos em melhores mãos, como a propaganda Tucana e os artistas da Globo
querem te fazer acreditar.
Em relação à corrupção, você pode ter certeza que
ela não vai acabar. Deve ser difícil de acreditar nisso, mas, ao contrário do
que brada a direita reacionária raivosa, o PT não inventou a corrupção. A
corrupção é simplesmente o principal meio dos ricos comprarem o Estado para
terem seus desejos atendidos. Os principais críticos da corrupção hoje são
aqueles que já estiveram e ainda estão envolvidos com fraudes e venda de
favores por baixo dos panos. Para ver isso, basta lembrar de que a rede Globo
apoiava a ditadura. Porque será que isso aconteceu? E quanto aos processos de
sonegação de imposto que esta empresa enfrenta entra ano, sai ano. Basta ver também
a tão falada construção do aeroporto em Minas Gerais por Aécio, que passou direto para a
família dele. Mensalão do PSDB, muito antes do PT chegar ao governo.
Privatizações em empresas de grande porte, como a Vale e as TELE’s por preços
literalmente de banana, completamente abaixo do mercado. Sem falar nas alianças
e campanhas financiadas, que voltarão para cobrar seu preço, caso o PSDB
retorne ao Governo. Esse argumento da corrupção foi aquilo que a grande mídia
(simbolizada pela rede Globo, principalmente) escolheu para atacar um partido
só porque não o quer mais no Governo, ou será que ainda alguém acredita que é
coincidência o “grandiosíssimo” e “malvado” escândalo de corrupção da PETROBRAS
ter vindo à tona justamente em época de eleições.
Esse documento não é para defender o PT,
como algumas organizações sentem obrigação de fazer em época de eleições. Todos
os problemas que a classe trabalhadora sente com o PT no Governo são reais. A
corrupção também existe, porque ela é intrínseca ao capitalismo. Mas, mais uma
vez, não podemos nos iludir e achar a mudança para um regime mais reacionário,
tão corrupto e capacho da burguesia quanto o PT é a solução. Caso Aécio ganhe,
a mudança virá e podemos garantir que será pra pior.
PT: a ilusão de uma esquerda
desesperada
Qualquer trabalhador se emociona com a história de
criação do Partido dos Trabalhadores, inclusive nós reconhecemos a importância
de sua fundação, um partido que conseguiu reunir a maior parte da vanguarda classe
trabalhadora e se tornar uma verdadeira referência nacional de massas. Isso
tudo num momento crucial que foi o fim da ditadura militar.
Muita coisa aconteceu desde essa época. Muitos anos
se passaram. Principalmente aqueles de 2002 até 2014. 3 mandatos consecutivos
do PT na presidência. Como reconhecemos a importância da criação desse partido,
agora que o tempo já é outro, precisamos dizer o que ele se tornou.
O PT passou por um processo muito grande de mudança
desde a sua criação. Para não demorarmos nesse debate, basta dizer que o partido
sempre foi formado por correntes (grupos) que estavam juntos sob a mesma
bandeira. Com o passar do tempo, uma corrente que defendia aliança com a
burguesia para poder reformar o Brasil, já com financiamento de empresas (desde
antes de Lula ser eleito pela primeira vez), conseguiu prevalecer em relação
aos outros grupos. Essa corrente prevalece até hoje e se chama Articulação.
Com a eleição de Lula, e a saída dos grupos menores
do partido (que deram origem mais tarde ao PSTU e PSOL, por exemplo), o PT
ficou a cargo da sua ala mais a direita e de outros grupos menores que
continuam lá até hoje. As alianças de campanha que o partido precisou fazer
para conseguir eleger um presidente, tanto com a burguesia, quando com os seus
lacaios (como o PMDB) fez com o PT fosse perdendo cada vez mais a influência da
sua origem em prol da criação do seu projeto de Governo. No fim desse processo,
o
PT passou de um partido operário de massas para um partido legitimamente
burguês, defensor da ordem capitalista, com influência e apoio parcial das
massas.
O projeto de sociedade do PT não é diferente
daquele do PSDB em sua essência, pois nenhum dos dois quer acabar com o
capitalismo, nem entrar em conflito com o capital. No entanto o projeto de
Governo é bastante diferente. O PT colocou em prática um governo que
podemos chamar de populista, que inspira a confiança da classe trabalhadora com
discursos nacionalistas contra os patrões, concedendo para parecer coerente, alguns
mínimos direitos para a classe trabalhadora; mas que continua a defender o
capitalismo sem questionamento atrás da cortina. Esse projeto de governo também
pode ser visto como um projeto de conciliação entre as classes: O PT sem dúvida
nenhuma é submetido aos interesses do capital, mas precisa do apoio popular
para continuar no Governo.
Aí é que entram as diferenças com o PSDB. Por
exemplo, o PT não pratica mais privatizações em massa, como o PSDB, mas
continua repassando bens e serviços públicos para a iniciativa privada
(privatização de portos e aeroportos, EBSEH, PROUNI, implementação das
parcerias público-privadas, etc.); e ao mesmo tempo toma medidas que
minimamente melhoram as condições de vida da classe trabalhadora, como o bolsa
família, o próprio PROUNI, cotas universitárias, aumentos salariais reduzidos
(mas ainda sim, aumentos), programa Mais Médicos.
Essa política econômica foi incrivelmente melhor
para o capital do que aquela do PSDB. Isso porque os bancos e empresas podiam
continuar fazendo o que sempre fizeram e tendo lucros recordes na história do
Brasil, enquanto o Governo conseguia manter a juventude (através da UNE, UBES)
e a classe trabalhadora (através da CUT) sob controle com algumas concessões
mínimas e propaganda ideológica. Isso é o motivo principal do porque a maior
parte da classe trabalhadora ainda se identifica muito com o PT.
Por mais que a vida da classe trabalhadora tenha
melhorado em alguns aspectos econômicos, e não podemos negar isso, o PT ainda
mantém a sociedade na estagnação do capital. Nada foi feito pelo SUS, que
continua tão precário como sempre foi. A educação pública, principalmente do
nível superior continua restrita a uma parcela muito pequena (7%) da juventude;
e ao invés de avançar na estatização de universidade privadas (nem sequer
quando estas vão à falência), o PT foi responsável pelo maior repasse de verba
da história para as empresas privadas de educação (através do PROUNI e crédito
direto). O PT é responsável pela repressão de atos de ruas, com a polícia e
greves com corte de ponto (atos de junho no ano passado, na época da Copa,
greves das universidades federais de 2012, de carteiros e petroleiros, e outras
tantas categorias). Apoia as UPP’s no Rio de Janeiro. Há poucos meses, mais 2
aeroportos foram entregues a iniciativa privada, dentre eles o Galeão do Rio de
Janeiro, um dos maiores do país. A especulação imobiliária, incentivada pelos
megaeventos, patrocinados pelo Governo, que tornou o Rio de Janeiro uma das
cidades mais caras do mundo para se viver e que foi responsável pela maior onda
de remoções da história, Aldeia Maracanã no RJ, Pinheirinhos em SP, etc.
Poderíamos continuar a lista, mas esses exemplos são
só para deixar claro que o PT não é uma alternativa para uma
sociedade melhor e mais justa. Poderia até ter sido, mas nunca se
tornou. São para mostrar que em qualquer momento, se a burguesia exigir um aperto
maior da classe trabalhadora, o PT não vai piscar duas vezes antes de abandonar
qualquer resquício do populismo que ainda resta no seu Governo e obedecer.
Essa parte do texto é uma crítica direta à tática de
que é correto defender voto crítico em Dilma no segundo turno, por conta de uma
falsa polarização da sociedade em torno de PT x PSDB. Muitos argumentos foram
apresentados pelas organizações que defendem essa posição, desde balanços da
conjuntura internacional miraculosos que levam a defender o PT nas eleições,
até que a CIA derrubou o avião de Eduardo Campos para tornar possível o segundo
turno, etc.
Esse é o impressionismo que falamos no início do
texto. É extremamente fácil se deixar levar pela empolgação dos acontecimentos
recentes, ainda mais quando temos a extrema direita colocando as asinhas de
fora e a Globo batendo no PT todo dia com o Jornal Nacional super imparcial que
já julgou o caso da PETROBRAS sozinho.
Mas aos companheiros que defendem essa posição, eu
pergunto: Qual é esse golpe que está sendo colocado em prática pela direita e
pelo imperialismo? Qual milícia está se formando para matar a presidenta? Toda
a propaganda contra o PT está dentro do regime legalista burguês; mesmo regime
que o PT nunca levantou sequer um dedo para criticar?
Como as condições internacionais são diferentes de
que quando, por exemplo, George Bush era presidente nos Estados Unidos, com uma
guerra por petróleo a cada esquina?
Como o Brasil se desalinhou com a política norte
americana? Foi quando ameaçou invadir a Bolívia quando houve rumores de
estatização da PETROBRAS em solo boliviano que faz papel de multinacional lá e
arranca as riquezas dos trabalhadores e trabalhadoras da Bolívia? Ou quando
enviou tropas para o Haiti?
Como o Brasil está num cenário mais reacionário
agora? Será que nunca existiu direita antes? Será que só agora nas eleições
estão sendo covardemente assassinados trabalhadores e trabalhadoras LGBTT’s? Só agora há pressão da direita para baixar a
maioridade penal? A Globo e o resto da mídia só agora começaram a falar mal do
PT?
É dito que o PT só chegou na presidência com a ajuda
do imperialismo e agora que o imperialismo quer supostamente tirá-lo, temos que
impedir? Por quê? Que jogo é esse que temos que tomar um lado, mas não ganhamos
nada quando algum vence? O que temos a ganhar com a vitória do PT?
O que acontece é o sentimento de frustração
por constatar que a direita ainda tem peso no Brasil e a esquerda não consegue crescer,
nem se unificar. Nesse túnel escuro, aparece o PT com a lanterna na mão,
encarnado numa caricatura de esquerda. E algumas organizações de esquerda acham
correto ficar supervalorizando e até inventando argumentos para justificar para
poder seguir o caminho da salvação do PT sem consciência pesada.
Não é difícil, nas condições que vivemos, se
desesperar e deixar de acreditar na força da classe trabalhadora em luta. Mas voltamos a reiterar
que o poder da classe trabalhadora não depende de quem está no Governo. Essa
força é a única possível de fazer frente ao estado burguês. Se perdermos isso
de vista agora, estamos alargando o fundo do poço que nos encontramos, sem
tentar fazer nada para sair dele.
E agora? O que fazer? Em quem votar?
Espero que tenha ficado claro que esse texto foi uma
tentativa de fazer uma análise da conjuntura política do Brasil, sem perder o
foco das eleições, que é um bom exemplo dessa conjuntura. Então nossa posição
principal em relação a essas questões: “O que fazer? Em quem votar?” é a que
descrevemos antes como a posição classista nas eleições.
É preciso dizer, em tempos de eleições mais
do que nunca, que o voto não muda o mundo nem a vida. Ser um eleitor consciente
faz parte da velha fábula do cidadão exemplar que tentam nos empurrar goela
abaixo desde que aprendemos a falar. O voto nessas eleições é uma parte mínima
da nossa vida política, provavelmente a menor de todas elas. Melhorias concretas
nas condições de vida, direitos conquistados, serviços públicos melhores e
gratuitos não dependem nem nunca dependerão do candidato que for eleito.
Dependem da luta e da organização da classe trabalhadora, da nossa classe
contra o Estado, contra banqueiros e empresários que nos atacam diariamente. Há
política para além do voto. Há política nos sindicatos, nos CA’s, DCE’s e
grêmios, nos locais de trabalho, estudo, moradia e principalmente nas ruas. Por
isso, pedimos, antes de pedir voto pra alguém, que você não perca as forças,
não perca as esperanças, que continue se organizando, continue lutando por uma
sociedade melhor, mais justa e mais livre, uma sociedade socialista.
Dito o principal, as eleições ainda vão acontecer do
dia 26 de Outubro e nós ainda somos legalmente obrigados a votar. Apresentamos
os argumentos necessários para afirmar que o voto não é mais importante. Mas o
que fazer na hora que estivermos na urna?
Nossa posição para o voto do segundo turno é
semelhante a do PSOL, com a diferença de denunciarmos o sistema eleitoral antes
de sugerirmos como votar.
Por tudo que apresentamos, pedimos que não se vote no PSDB,
por tudo aquilo que esse partido representa. Por defender os interesses
da burguesia até as últimas consequências, como fez Fernando Henrique Cardoso.
Por conta de toda a reação e o retrocesso de vida que estão reunidos ao redor
de Aécio Neves. A volta da direita não representa nenhuma alternativa para um
Estado melhor, nem para uma economia melhor, e muito menos para uma sociedade
melhor. Votar na direita é votar errado, sempre e em qualquer situação. Votar
na direita é uma concordância simbólica com tudo que está de errado no mundo e
a permissão para que tudo isso continue e piore ainda mais. É um verdadeiro
retrocesso.
Aos companheiros e companheiras que votam
nulo porque chegaram na conclusão que o problema é o estado ser dos ricos e
patrões e não o candidato que ocupa a presidência, pedimos que continue votando
nulo. Não seremos nós que pediremos a você para votar no PT. Por mais
crítico que esse voto possa ser, não seremos nós que pediremos para votar num
partido que está do outro lado da trincheira e que nunca , depois que chegou ao
governo, demonstrou nenhuma intenção de atacar aqueles com quem fizeram
aliança, nossos verdadeiros inimigos.
Aos companheiros e companheiras que se
identificam com o PT porque o PT apresentou um projeto de Governo, cuja única
política para a classe trabalhadora não é apertar até não poder mais. Que
considera que os avanços sociais e as pequenas melhorias econômicas foram
importantes para a condição de vida da classe trabalhadora, favorecendo a própria
organização da classe, e/ou que simplesmente lembra da época do PSDB no Governo
e acha que votar no PT é uma forma crítica de manter o PSDB longe por mais 4
anos, porque nunca mais quer o fantasma dessa cambada de volta; nós também não
diremos pra você votar nulo. Já que não foi possível a esquerda apresentar uma
verdadeira alternativa classista que contemplasse a classe trabalhadora,
durante ou por fora das eleições, não seremos nós que vamos dizer que está
errado votar no único partido que representa uma mínima resistência à direita
mais reacionária do Brasil no segundo turno.
Por isso, para resumir, dizemos:
Não saia das ruas e nem abandone as lutas! As melhorias de
vida e vitórias acontecem lá!
Nessas eleições não tem voto certo, mas tem voto errado. Não
vote Aécio!
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