Ese texto é contém uma autocrítica parcial do nosso panfleto "Bombeiros: lutar junto aos trabalhadores, contra os patrões, o BOPE, os coroneis da PM e Cabral!".
O levante dos bombeiros
Não existe ninguém que não ficou sabendo das manifestações do corpo de bombeiros que começaram desde o mês de Maio desse ano e vêm se prolongando até os dias de hoje. Não há quem não tenha visto um carro, um ônibus ou até mesmo uma viatura de polícia com a popular fitinha vermelha amarrada. Muitos até acompanharam firmemente o desenrolar da luta dos bombeiros contra o governo.
No início das manifestações, houve algumas passeatas no centro da cidade, que nem sequer fecharam rua nenhuma. O movimento permaneceu assim por um tempo, tentando passar a mensagem de ser disciplinado e ordeiro, mas as coisas mudaram quando o ilustríssimo brincalhão Sérgio Cabral deu declarações menosprezando as manifestações dos bombeiros, dizendo pra deixar os bombeiros andarem, pois andar faz bem à saúde.
Com isso, os manifestantes perceberam que o buraco era mais embaixo. Tomaram coragem e começaram a fazer manifestações que fecharam importantes ruas do centro da cidade, até que na madrugada do dia 03 de Junho, de sexta para sábado, houve a tal ocupação do quartel no centro da cidade pelos próprios bombeiros. Sem perder tempo, o governador malandrão tentou desocupar o quartel pra não ficar mal na fita. Primeiro na base da lábia. Como os bombeiros se recusaram, o governador surpreendentemente apelou para a violência (como já é de costume), e mandou o BOPE invadir o quartel descendo o cacete e prendendo todo mundo.
Mesmo a partir daí, com a prisão de 439 bombeiros, o movimento continuou, surgindo facilmente uma forte identificação da população com as causas dos bombeiros. Um grande sentimento nacionalista tomou conta facilmente não só dos manifestantes, mas também de toda a massa que apoiava os bombeiros, um sentimento de que era necessário dar as condições dignas de trabalho para os homens salvam vidas e que defendem a pátria brasileira.
A mídia podre, é claro, não perdeu tempo em tentar desencorajar a ocupação, como já é de praxe com qualquer movimento popular. Mas mesmo assim, não conseguiu impedir as pessoas de irem às ruas e apoiar o movimento dos bombeiros em manifestações que há muito não se viam no Rio de Janeiro.
Afinal de contas? Qual é a função do bombeiro?
Qual seria a posição correta em face desses acontecimentos? Qual linha poderia dar um caráter revolucionário a essas manifestações? Apoiar os heróis do Brasil? Todo apoio aos bombeiros militares?
Claro que não! Seria bem mais fácil se fosse assim, confesso. Deve ser por isso, inclusive, que os companheiros do PSTU e PSOL tanto se entusiasmaram com as manifestações dos bombeiros. Se esqueceram até de fazer suas críticas e tendo feito parte da organização dos atos, ficaram com o rabo entre as pernas na hora de impedir que o ato da manhã do dia 12 de Junho se tornasse uma adoração a pátria brasileira, em comunhão com a PM.
O bombeiro militar desempenha o que Marx veio a chamar de trabalho improdutivo, mas necessário. O corpo de bombeiros tem um papel de manutenção das forças produtivas, algo como um trabalho no setor de serviços. Suas principais atividades são de salvamento e ações contra incêndios. Podemos colocar, de acordo com isso, os bombeiros como fazendo parte da classe trabalhadora.
Infelizmente, nem tudo são flores. Os bombeiros fazem parte atualmente das forças militares. Toda e qualquer força militar, que não seja os próprios trabalhadores organizados independentemente do Estado, responderá em última instância ao próprio Estado. Todo e qualquer Estado só existe para “legalizar” e militarmente manter e a submissão da classe oprimida (neste caso, a classe trabalhadora) em relação a classe opressora (burguesia). Sendo assim o papel das forças militares da sociedade representa na prática uma força de repressão do governo, com o único objetivo de oprimir diariamente a classe trabalhadora e principalmente suas camadas mais exploradas da sociedade. O exemplo claro do papel dos bombeiros nessa função é a participação das milícias no Rio de Janeiro, onde quase um terço dos milicianos são bombeiros militares. Podemos colocar, de acordo com isso, os bombeiros como sendo da mesma laia da polícia.
De acordo com essa análise, a definição da função social desempenhada pelos bombeiros militares tem um caráter duplo, podendo tanto ser caracterizada como a de um trabalhador do setor de serviços, ou como a de um policial opressor. Por conta dessa dupla caracterização, colocamos como medida imediata, a criação de um corpo de bombeiros público e civil, sob o controle de comitês de bairros, através do desarmamento dos bombeiros militares.
Antes de prosseguir, é importante frisar que a desmilitarização do corpo de bombeiros, não pode ser de forma alguma confundida com a privatização do mesmo, proposta que já circula formalmente dentro das instituições legislativas burguesas. Tirar o corpo de bombeiros das mãos do estado e colocar nas da burguesia não muda em nada e até piora a situação da classe trabalhadora.
Continuando, essa demanda de desmilitarização do corpo de bombeiros coloca a importância de fazer com que profissionais que prestam serviços essenciais à população deixem de obedecer a uma cadeia hierárquica estúpida, onde em última instância é o estado burguês quem manda. Por isso não podemos deixar de colocar o caráter progressivo do ato do dia 03 de Junho, onde centenas de bombeiros ocuparam o quartel central da corporação no centro do Rio de Janeiro, batendo de frente com o governo. Este embate deu um caráter combativo ao movimento dos bombeiros, formando um cenário onde seria muito mais fácil colocar as contradições entre as políticas do Estado e as demandas por melhores salários dos bombeiros e com isso, a necessidade de um corpo de bombeiros civil, controlado pela própria classe trabalhadora.
O desfecho do ato foi a repressão e prisão de 439 bombeiros feitas sob ordem do espertalhão governador e executadas, adivinhem por quem? Por uma própria instituição militar: a polícia militar, mais especificamente o BOPE. Alguns momentos depois, o governador, não satisfeito com a situação, fez questão de ir à rede nacional, xingar os bombeiros de vândalos irresponsáveis. Mais tensão entre o corpo de bombeiros e o estado. As coisas tinham quase tudo pra evoluir.
A traição
Infelizmente, o rumo dos fatos mudou. Depois da primeira porrada, os bombeiros mudaram sua tática. Ao invés de continuarem com seu caráter combativo, chamando os outros setores da população a entrarem em greve, levantar a bandeira de desligamento do estado, etc..., decidiram recorrer ao estado burguês. É... o mesmo estado responsável pelos espancamentos e prisões deles próprios na ocupação do quartel. A ilusão, de que o governador era um malvado e existia deputados e vereadores bonzinhos, venceu.
Aconteceram alguns atos, em frente a ALERJ, onde os bombeiros chamavam a população pra apoiar a sua causa e ir lá exigir dignidade, agora com a bandeira de pacifismo e legalidade.
Tudo culminou no ato de domingo, dia 12 de Junho, onde mais de 30 mil foram às ruas de Copacabana apoiar as reivindicações dos bombeiros, anistia dos presos, aumento de salários e etc. Porém, a principal característica desse ato, foi a infeliz aliança dos bombeiros com a PM. A maior manifestação popular carioca dos últimos tempos tomou um caráter completamente reacionário, com discurso patriótico, que tudo tem que ser feito obedecendo as leis do estado, pois o governador ia se arrepender, etc.
Os bombeiros que antes tinham escolhido lutar contra o estado burguês, como integrantes da classe trabalhadora, voltaram atrás e caem num clima de pacifismo e numa aliança com a polícia racista e opressora. O apoio que deveria ter sido dado antes, na ocupação do quartel, perde todo o sentido diante de uma manifestação de direita como essa. Isso vale pras demandas de aumento salarial também. Caberia apoiá-las condicionalmente, quando a luta dos bombeiros pudesse caminhar pra algum episódio de luta contra o estado burguês, mas quando essas manifestações tomam um caráter tão bizarro, como aconteceu, não faz sentido dar qualquer apoio a elas.
Enfim, a pergunta que não quer calar é: Onde estava a tão presente “esquerda” quando essa virada se deu? Fazendo as críticas? Agitando a palavra de ordem de desmilitarização? Denunciando o papel da polícia militar, que tinha inclusive reprimido os próprios bombeiros na ocupação do quartel? Infelizmente não. As principais correntes da “esquerda” aqui no Rio de Janeiro, PSTU e PSOL abaixaram a cabeça e calaram a boca, a não ser pra aplaudir a palhaçada que tinha virado o ato.
Mas isso já era de se esperar. Os companheiros já têm um histórico que fala pela sua própria política. Apóiam a badalada PEC 300, proposta de ementa constitucional que quer elevar os salários de todos os militares do Brasil. Todos mesmo... Sabe os policiais do BOPE? Eles também. Sabe os milicianos? Policiais do choque de ordem? Das UPP’s? Tropas de ocupação do Haiti? Todos eles. Os companheiros que dizem representar a esquerda revolucionária do Brasil querem que os gentis senhores de farda ganhem mais e tenham melhores condições de trabalho pra espancar e oprimir a nós, trabalhadores.
Os exageros
A polícia é pilar e símbolo principal da repressão diariamente necessária que o Estado tem que exercer pra manter a ordem. Pra impedir que os mais pobres e oprimidos da sociedade lutem por uma sociedade justa e igual, uma sociedade socialista. Ao contrário dos bombeiros, a polícia não desempenha nenhuma função socialmente necessária, muito menos em prol da classe trabalhadora. Apoiar qualquer luta por salários e melhores condições de “trabalho” desse setor é ir diretamente contra a classe trabalhadora. Por isso, em relação à polícia, nada mais natural do que defender o próprio fim dessa instituição.
Apesar do papel claro que a polícia desempenha, e do fato dos bombeiros terem escolhido ficar do lado dos policiais. Os bombeiros militares são diferentes da polícia militar, como já foi analisado e dito anteriormente. Algumas organizações menores, orgulhosas de baterem no peito e se dizerem mais revolucionárias que as outras, acabam caindo no outro extremo dos oportunistas do PSTU/PSOL, e colocam um sinal de igual entre a polícia e os bombeiros, com o argumento inquestionável de que os bombeiros fazem parte da forças militares do estado e se hoje eles quase não desempenham papel de opressão é porque a conjuntura não exige, exigindo assim, o fim do corpo militar de bombeiros.
Argumento de autoridade, certo? Mas vamos parar pra pensar um pouco. Alguns guardas, colocados em shoppings, estações de metrô/trem, etc. exercem um papel repressor racista muito forte, mas também são colocados lá pra dar informações. Para acabar com o caráter repressor dessas profissões, seria necessário acabar com suas profissões, como no caso da polícia? Não seria possível simplesmente acabar com a função repressora? Sim, de fato seria possível. O fim da função repressora nem sempre está condicionado ao fim da profissão em si. Até porque, ninguém defende o fim dos bancários, mas acontece de um bancário ser obrigado a quebrar sigilo financeiro, ou congelar contas de trabalhadores. E quanto a motoristas e trocadores de ônibus que impedem trabalhadores de entrar no transporte quando estes não tem dinheiro pra passagem? Devemos clamar pelo fim de motoristas e trocadores de ônibus, como estas organizações fizeram com os bombeiros? Nem sempre é necessário dar cabo de profissões que exercem repressão para acabar com esta repressão.
Quase todas as profissões, dependendo da conjuntura, podem e irão desempenhar um papel repressor! Isso significa que devemos comparar um médico de hospital particular a polícia, ou que devemos exigir que professores particulares parem de exercer sua profissão? Esses companheiros da LER-QI, LC, LBI são inconseqüentes ao igualar os bombeiros à polícia. Pois o fim da polícia significa destruir o corpo de policiais militares, destituir todos os seus membros de suas funções e deixar nas mãos da classe trabalhadora o papel de se defender. Quando se trata dos bombeiros, isso é não só exagero, como desnecessário. Para que os bombeiros parem de ter o caráter repressivo, basta que estes não tenham porte de armas, que deixem de responder ao estado (desmilitarização), e comecem a responder aos trabalhadores.
Conclusão
A incapacidade da esquerda brasileira, nesse caso dos bombeiros do Rio e em muitos outros a nível nacional, traduz a necessidade da criação de um instrumento da classe trabalhadora, que poderia por exemplo, dar um rumo descente a essas manifestações dos bombeiros. Disseminar a necessidade dentro da classe trabalhadora de uma ação unificada contra o Estado, para tirar o verdadeiro inimigo do poder: a burguesia. Se você concorda com isso, venha nos ajudar na criação deste instrumento, na criação do Partido Revolucionário dos Trabalhadores.
Por um corpo de bombeiros civil e público, sob controle de comitês de bairros.
Contra a privatização do corpo de bombeiros.
Não a PEC 300 !
Pelo fim da polícia. Por organizações de autodefesa dos próprios trabalhadores, independente do Estado burguês safado.
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