Essa é a apostila que vamos usar no nosso minicurso sobre história do trotskismo no Brasil, que vamos fazer em janeiro. O objetivo não é esgotar o assunto, e sim abrir a discussão, por isso o formato em tópicos e as perguntas. Se você quiser participar, entre em contato pelo nosso email.
História do Trotskismo no Brasil
Pergunta para discussão:
Por que devemos estudar esse tema? Qual é a
utilidade desse estudo para o CL hoje?
Proposta:
Vamos dividir a história das correntes trotskistas
em sete ciclos, de acordo com os períodos históricos, mostrando quais são as
questões principais e como elas foram respondidas pelas organizações.
1° Ciclo: 1927-1945
A burguesia industrial começa a luta
pelo poder, contra o acordo do “café com leite” (MG-SP), dos latifundiários e
exportadores. Isso leva à revolução de 1930, que coloca Vargas no poder. A
partir de 1937, Vargas dá um golpe e ganha poderes ditatoriais (Estado
Novo).
O PCB é formado em 1922, a partir de anarquistas que
seguiram o exemplo da revolução russa. Quando o PCB é reconhecido pela IC, em
1928, já é no contexto do stalinismo. Em 1922, acontece também a primeira
revolta tenentista, expressando a revolta das camadas médias urbanas contra a
república velha. A partir daí, o PCB começa a defender o protagonismo da
pequena burguesia (e, depois de 1934, da burguesia nacional) na atual etapa da
revolução brasileira.
A primeira org trotskista brasileira é o GBL (grupo
comunista Lênin), formada em 1927 por Mário Pedrosa e João Costa Pimenta, entre
outros, como seção brasileira da Oposição de Esquerda Internacional. Depois, o
GBL vira LCI (Liga Comunista Internacional).
A LC ganhou controle de parte do trabalho sindical
do PCB, sendo maior que o partido em SP, onde dirigia principalmente a federação
dos gráficos. Eles também tentaram ganhar para o leninismo o próprio Prestes,
que chegou a escrever um manifesto muito influenciado pela LCI, mas logo depois
ele entrou no PCB.
Durante a revolução de 1930, em que a linha do PCB
foi abstencionista, a LCI interviu defendendo a assembleia constituinte. E o
foco principal da luta política da LCI foi o antifascismo, com o episódio da
Batalha da Praça da Sé (1934), que destruiu a influência dos integralistas nas
ruas.
Depois da repressão contra a ANL (a LCI tinha criticado
o programa etapista da ANL e a sua ilusão na aliança com a burguesia nacional),
em 1935, a LCI foi destruída. Logo depois, se reconstituiu como POL (partido
operário leninista), já na ditadura Vargas.
Em 1939, se funde com a dissidência de SP do PCB, dirigida por Hermínio
Sachetta, formando o PSR (partido socialista revolucionário). A ruptura do
Schachtman em 1940 (que Mário Pedrosa apoiou) levou à crise o PSR. O Mário
Pedrosa, em 1946, fundou o PSB.
2° Ciclo: 1945-1953
Um grande movimento democrático derruba a ditadura
varguista, levando a um novo período democrático. No começo, o PCB é
legalizado, com um programa completamente reformista de “união nacional”,
chegando a eleger Prestes como senador, e tem 300 mil filiados. Já em 1947,
Dutra coloca o partido na ilegalidade.
O PSR intervém, principalmente contra o peleguismo
do PCB nos sindicatos, em defesa da frente única e das comissões de fábrica.
Mas a crise da IV Internacional leva à dissolução do PSR, em 1958 (Sachetta
participou do congresso de 1951 e foi contra Pablo, porque achava que a URSS e
os países do Leste Europeu eram capitalistas de Estado). A partir daí, a seção
brasileira da IV passa a ser o POR(T) (partido operário revolucionário
trotskista), enquanto Sachetta funda a LSI (liga socialista internacionalista),
com uma dúzia de militantes, que se considerava luxemburguista.
3° Ciclo: 1953-1968
Esse é o período do nacionalismo burguês no
movimento de massas (O petróleo é nosso, reformas de base, a eleição do Jango),
até o golpe de 1964. Depois de um curto período insurreicional (mas ainda
etapista), de 1950 a 1958, o PCB passa a apoiar o trabalhismo como a fração da
burguesia que poderia fazer a revolução democrática.
A partir de 1953, o POR(T) representou no Brasil as
posições do BLA (Birô Latinoamericano do Secretariado Internacional de Pablo e
Mandel), e de seu dirigente, J. Posadas. Houve uma capitulação cada vez maior a
setores nacionalistas pequeno-burgueses (por exemplo, em 1963, o POR(T) exigiu
que Brizola “rompesse com a burguesia pra tomar o poder”), o que levou a uma
crise crescente no partido.
Apesar de tudo, o POR(T) teve o mérito de ter uma
política para o movimento camponês, construindo as Ligas Camponesas no
Nordeste, e defendendo a revolução agrária e o justiçamento dos latifundiários,
contra toda a tradição do trotskismo brasileiro que, desde a LCI, via o campo
como essencialmente capitalista, negando a questão camponesa. O POR(T) também
participou dos Grupos de Onze, criados pelo Brizola para resistir ao golpe
militar.
No final desse ciclo, surgiram duas organizações
revolucionárias não-trotskistas, a POLOP e o PCBR, que negavam a revolução por
etapas e a via pacífica para o socialismo. Na formação do PCBR estava também o
grupo de Sachetta, que na época já se chamava MCI. Da POLOP surgiu o POC
(partido operário comunista), que foi a seção brasileira do SU depois de 1968,
quando Posadas rompeu com o SU. Essas organizações, por causa da defesa da luta
armada, cresceram muito mais que os grupos trotskistas da época, pelo menos até
a segunda metade da década de 1970.
4° Ciclo: 1968-1978
São as dissidências do POR(T) que vão limpar o nome
do trotskismo brasileiro. A Organização Comunista 1° de maio (SP), a Fração
Bolchevique Trotskista (RS) e Dissidência do POR de Pernambuco resistiram a
partir de 1968, à capitulação do POR aos nacionalistas, sempre criticando a
guerrilha (que era a opção da maioria esmagadora da vanguarda) e intervindo no
movimento sindical. Todos eles defendiam a reconstrução da IV internacional e
se alinhavam internacionalmente com o lambertismo.
Em 1976 (quando a luta armada já tinha sido
derrotada em todo o país), esses grupos se fundem e formam a OSI (organização
socialista internacionalista), com mais de 2 mil militantes em plena
clandestinidade, que foi a maior org trotskista brasileira até então. Ela
defendia a assembleia constituinte como palavra de ordem contra a ditadura, e a
formação de sindicatos paralelos à estrutura controlada pelo Estado. No
movimento estudantil, formaram a Libelu (liberdade e luta) a maior corrente
estudantil da época.
Ao mesmo tempo, surge em 1973, no exílio no Chile, o
grupo Ponto de Partida, que se implanta no Brasil a partir de 1976, e que vai
formar depois a Convergência Socialista.
5° Ciclo: 1978- 1989
Esse ciclo é marcado pelo ascenso generalizado que
durou por todo o período, e que gerou o PT, a CUT e o MST. Podemos dizer que,
em geral, todas as organizações se construíram por dentro do PT, e se adaptando
a ele.
As correntes que se reivindicavam trotskistas do período foram:
- DS, seção brasileira do SU, que defendia o “PT
estratégico” (=transformar o PT em partido revolucionário), o que a levou a
estar no PT até hoje. A DS foi a corrente que mais incorporou as preocupações
dos “novos movimentos sociais”, como o feminismo, o ecologismo, libertação gay,
movimento negro etc.
- O Trabalho, seção da IV Internacional lambertista,
que considera que estar no PT é parte da política de frente única operária. OT,
ao contrário da DS, é obreirista e se constrói somente nos sindicatos e
movimento estudantil.
- CS (convergência socialista), morenista, tem uma
política de entrismo no PT, que a leva algumas vezes a atuar contra todas as
outras correntes do partido.
- Causa Operária, racha do lambertismo, também fez
entrismo, mas bem menor que as outras.
Os posadistas, que continuaram a existir, como
corrente do PT, mas muito pequena.
A participação no PT se comprometeu a partir
da Frente Brasil Popular, em 1989. Como CO foi contra, eles foram expulsos no
mesmo ano. A CS foi expulsa em 1992, por ser contra a posse de Itamar depois do
Fora Collor.
6° Ciclo: 1989-2003
Durante todo
um período, a questão principal para os trotskistas era estar ou não no PT (e
qual a política a adotar em relação ao PT). Nesse período de refluxo
generalizado e destruição da URSS e seu campo, a fragmentação das correntes
trotskistas se acelera cada vez mais, gerando as correntes que vemos hoje (LBI,
Rebento, FT-VP, POR, POM, LOI, LER, CST, MES, LSR, LQB etc), geralmente em
setores marginais do movimento, fazendo oposição na CUT e na UNE. A CS vira
PSTU e se torna o maior partido que se reivindica trotskista no Brasil e o terceiro
maior no mundo (2200 militantes em 2002, hoje cerca de 1500).
Então, todas as
outras correntes têm a política do PSTU como referência de oposição, como é até
hoje.
Ponto de
discussão: você conhece essas orgs e suas políticas?
7°Ciclo: 2003-
O refluxo se acentua qualitativamente com o governo
do PT. O governo leva a uma resolução da questão do PT para quase todas as
correntes (inclusive é o motivo do racha da DS com o SU). Ao mesmo tempo, a
política do PSTU de romper com a CUT e a UNE coloca mais essa polêmica entre as
orgs, que continuam se fragmentando a partir dos rachas anteriores (MR, LC, EMPT,
LM, CRQI etc). A formação do PSOL, em
que muitas dessas correntes participam, leva a uma divisão entre as mais à
direita e as mais extremistas.
Ponto de discussão: o que fazer a partir da
fragmentação atual? Como responder às polêmicas atuais à luz dos outros ciclos?
Sugestões de leitura:
Na Contracorrente da História. Fúlvio Abramos e
Dainis Karepovs. Ed. Brasiliense. Reproduzido no site da LER: http://www.ler-qi.org/spip.php?rubrique157
Trotskyism in
Brazil. Osvaldo
Coggiola. http://www.marxists.org/history/etol/document/brazil/brazil01.htm
À Esquerda da Esquerda. Murilo Leal. Ed Paz e Terra.
Livro sobre o POR(T)
História das Tendências no Brasil. Antônio Ozaí da
Silva. Proposta Editorial.
O PT e os marxismos da tradição trotskista. Antonio
Ozaí da Silva. http://www.espacoacademico.com.br
/000/0trotskismo.htm
É um estudo superimportante, porém da forma como se apresenta contribui pouco para um balanço sério sobre a história do trotkismo no Brasil. Seria mais objetivo e proveitoso se colocasse em formato de gráfico demonstrando a origem cronológica e de qual origem ele surge ou de qual racha se preferir.
ResponderExcluirDesta forma transparece uma intencionalidade de demonstrar que a experiência do trotkismo no Brasil pouco serviu como um norte para vitórias da classe trabalhadora. Por isso, acho que seria mais valido procurar sintetizar o que realmente encontramos de fios de continuidade do legado de trostky, quais foram os balanços da políticas apresentadas em respostas a conjunturas especificas. Espero que os camaradas tenham avançado sobre este norte durante o curso. Sds.
ResponderExcluirThiago,
esse formato é melhor do que o gráfico, porque permite que a gente coloque a conjuntura da época, as palavras de ordem mais importantes e alguns comentários sobre as organizações que seria difícil encaixar num gráfico.
Não temos intenção nenhuma de desqualificar a experiência do trotskismo brasileiro, estamos organizando esse minicurso exatamente pelo contrário: para mostrar como a história se desenrolou e quais lições podemos tirar dela.
A gente ainda não fez o curso (e você tá convidado!), mas realmente o mais importante é fazer um balanço sobre a experiência do trotskismo no Brasil. O minicurso que vamos fazer é introdutório, para militantes que, na grande maioria, nunca tiveram acesso a uma visão geral da história do trotskismo no Brasil (aliás, nem existe algum livro sobre esse tema, o que existe são livros sobre cada ciclo desses que aparecem na apostila). Por isso, nós achamos que é melhor dar essa visão geral antes, pra que eles tenham condições de contribuir na discussão sobre esse balanço, em vez de a gente já chegar com uma posição pronta que inclusive alguns militantes do próprio CL não teriam base para avaliar se realmente reflete a realidade.